Por que os programas de bem-estar não vão resolver o burnout

Se quisermos de fato combater e prevenir o problema, temos que nos responsabilizar pela construção de uma cultura mais justa, humana e positiva

Crédito: Dmitrii Guzhanin/ iStock

Renata Rivetti 4 minutos de leitura

Aulas de mindfulness. Yoga. Grupos de corrida. Terapia. Ginástica. Todos os programas de bem-estar são ótimos e bem-vindos. Porém, por mais que ajudem individualmente as pessoas, eles tratam sintomas e não as causas do stress e burnout no trabalho.

São gastos milhões de dólares anualmente em programas de bem-estar nas empresas e o problema da saúde mental continua crescendo de forma significativa. Segundo a Mental Health Foundation, cerca de 13% das licenças médicas, hoje, são por questões de saúde mental. O número de pessoas adoecidas com certeza é maior, pois ainda há aqueles que preferem nem se tratar, por medo, e continuam trabalhando até o esgotamento.

É preciso, então, entender que o burnout não vem de um adoecimento individual e que dar ferramentas para as pessoas cuidarem de seu bem-estar não vai tratar a raiz do problema.

Segundo uma pesquisa da McKinsey, para 70% dos respondentes, a principal causa do burnout é o ambiente tóxico.

Segundo pesquisa da McKinsey com 15 mil funcionários de 15 países, 59% passaram ou estão passando por um desafio de saúde mental. A pesquisa aponta ainda que funcionários que estão enfrentando desafios na saúde mental têm uma chance quatro vezes maior de sair da empresa e duas vezes maior de estar desengajados no trabalho. Ou seja, os desafios da saúde mental estão impactando e custando muito para as organizações, além dos impactos na sociedade.

Mas o grande desafio é atuar no que está causando o burnout, não somente atuar nos sintomas. Infelizmente, a maioria das organizações tem realizado investimentos em benefícios e programas de bem-estar que não vão mudar o principal problema.

Segundo a pesquisa da McKinsey, para 70% dos respondentes, a principal causa do burnout é o ambiente tóxico.

Ou seja, não adianta oferecer uma aula de mindfulness, ou uma terapia, se a comunicação não é transparente, se não há segurança psicológica, se não há reconhecimento e valorização, se há comando e controle, se o ambiente é competitivo e os líderes pouco empáticos.  

A verdade é que as empresas não entenderam ainda que felicidade corporativa não é oferecer benefícios superficiais ou programas de bem-estar. Tudo isso é interessante, são fatores higiênicos, que as pessoas reclamam se não tiverem.

Porém, o que deveria de fato ser priorizado é uma conscientização para que todos entendam que é preciso mudar a forma com que nos relacionamos nas organizações. Se a liderança continuar acreditando que sempre foi assim e sempre alguém vai aceitar as condições que propomos, continuaremos adoecendo as pessoas.

IMPACTO DA LIDERANÇA NA SAÚDE MENTAL

Em um mundo que já é tão desafiador, em que vivemos com tanta comparação e competição, as empresas poderiam e deveriam assumir a responsabilidade de cuidar das pessoas, ajudá-las a florescer, se desenvolver, e não deixá-las doentes como tem acontecido.

O impacto dos líderes em nossa saúde mental é igual à de nossos parceiros. Os líderes impactam mais na saúde mental do que os psicólogos. Então, está mais do que na hora de mudarmos e nos conscientizarmos de que esse problema é responsabilidade de todos nós.

As empresas não entenderam ainda que felicidade corporativa não é oferecer benefícios superficiais ou programas de bem-estar.

Então, o que de fato precisa ser feito para melhorarmos esses indicadores tão preocupantes? Como podemos prevenir impactos na saúde mental dos funcionários?

Certamente, precisamos primeiro construir uma base de segurança psicológica, por meio dos quatro eixos que a dra. Amy Edmondson nos traz: criar espaço seguro para rever atitude diante dos erros; construir um ambiente com comunicação clara e transparente; proporcionar um ambiente colaborativo; e priorizar a diversidade, inclusão e equidade.

Além disso, temos que transformar o modo como nos relacionamos nas empresas: é preciso construir relações de confiança, empáticas, humanas, ter líderes que valorizam e reconhecem seus times, além de aplicarem um espaço para escuta ativa. E também novos modelos de jornada de trabalho, com mais flexibilidade e autonomia.

É preciso repensar a sobrecarga de trabalho, os excessos de reuniões, o comando e controle, a microgestão. Parece difícil, mas é possível e, no final, não precisa de um grande investimento. Precisa de conscientização, autorresponsabilidade, mudança de hábitos e atitudes. E do engajamento de todos nessa transformação. Não será do dia para a noite, mas depende muito mais de nós. 

Se quisermos de fato combater e prevenir o burnout, teremos que agir, nos responsabilizando pela construção de uma cultura mais justa, humana e positiva.


SOBRE A AUTORA

Renata Rivetti é fundadora e chief hapiness officer da Reconnect - Happiness at Work, especializada em felicidade corporativa e lidera... saiba mais