Como o Ozempic está ajudando a acabar com o movimento da moda inclusiva

Marcas de moda têm recuado em seus esforços para incluir tamanhos maiores em suas coleções

Créditos: CR, Liudmila/ Chernetska/ iStock

Elizabeth Segran 5 minutos de leitura

Em 2020, Ashley Graham se tornou a primeira modelo plus size da Vogue. Alguns meses depois, Lizzo, estrela pop e defensora do movimento body positive, foi capa da revista. Na mesma época, Hollywood deu sinal verde para filmes que abordavam diretamente o tema da diversidade de corpos.

Em 2021, a marca Old Navy anunciou que reformularia todo o seu processo de criação e o visual das suas lojas para garantir que todas as peças estivessem disponíveis em tamanhos do XP ao XXL.

Mas quando 2023 chegou, o entusiasmo em torno da moda inclusiva se dissipou. Na Fashion Week, as modelos maiores ficaram claramente ausentes de fora das passarelas – uma mudança brusca em relação aos anos anteriores, quando os mais diversos tipos físicos foram incluídos.

Tanto a Old Navy quanto a Ann Taylor Loft reduziram suas linhas em tamanho plus size.  E ja faz três anos que a revista Vogue não traz nenhum corpo gordo em sua capa.

O que está por trás desse retrocesso no movimento de inclusão de diferentes corpos na moda? A resposta é complicada, dizem os especialistas do setor e os defensores do body positivity. Mas é impossível ignorar o impacto de uma nova classe de medicamentos para perda de peso, como o Ozempic e o Wegovy, cuja popularidade disparou recentemente.

Esses medicamentos estão transformando a gordura, que era considerado um aspecto natural da vida, em um problema de saúde a ser tratado pelo sistema de saúde. Com base em minhas pesquisas, possivelmente esses fármacos estão influenciando também as decisões comerciais no setor da moda.

Mas ainda há muitas mulheres plus size no mundo, e isso não deve mudar. Quem é que vai atender às necessidades desse mercado tão expressivo?

COMO O OZEMPIC MUDOU O JOGO

Para Katie Sturino, defensora da aceitação dos diferentes corpos, não é mera coincidência o fato de o setor da moda ter perdido o interesse pela inclusão na mesma época em que as celebridades começaram a perder peso.

Atores e músicos plus size pareciam estar todos emagrecendo, um atrás do outro. Surgiram rumores de que muitos deles estavam tomando Ozempic para provocar a perda de peso.

Os executivos do setor de moda também estavam acompanhando de perto esse fenômeno na cultura pop. Os empresários do setor de moda são muito atentos às tendências. Eles notaram que os corpos maiores, como os de Lizzo e Ashley Graham, não eram mais considerados merecedores das capas da Vogue. Em vez disso, a revista deu destaque à transformação de Adele para perder peso.

Como veterana do setor que já trabalhou em marcas tradicionais, Julie Carnevale, cofundadora da marca plus size Eloquii, acredita que as empresas de moda presumiram que expandir sua oferta de tamanhos seria uma maneira rápida e fácil de ganhar mais dinheiro. 

Mas, na realidade, a fabricação de roupas tamanho grande é muito mais complicada do que parece. "Nos últimos cinco

as empresas de moda presumiram que expandir sua oferta de tamanhos seria uma maneira rápida e fácil de ganhar mais dinheiro.

anos, quando a conversa girava em torno de aceitar seu corpo, os líderes empresariais decidiram entrar na onda, achando que essa seria uma nova fonte de receita", diz ela.

Carnevale afirma que algumas marcas que expandiram sua oferta de tamanhos estavam ansiosas para sair do mercado plus size, então essa mudança foi uma boa desculpa para que elas desistissem.

"A triste realidade é que a inclusão de tamanhos maiores era apenas mais uma tendência", observa. "Agora que o padrão magro está de volta, as marcas estão usando isso como uma desculpa para se desfazer de suas linhas de tamanhos inclusivos."

O RECUO DAS MARCAS

Nos últimos anos, muitas marcas reduziram suas ofertas de tamanhos grandes. O exemplo mais notável disso foi a Old Navy, cuja CEO, Nancy Green, anunciou que a nova linha de tamanhos inclusivos era o "maior lançamento da história da marca". 

Mas imediatamente após o lançamento dessa linha, as vendas começaram a declinar, chegando a uma queda de 19%. Green pediu demissão depois de apenas dois anos no cargo. E a Old Navy anunciou que reduziria seu programa de inclusão de tamanhos maiores. Isso foi um golpe para muitos defensores da moda inclusiva, que argumentaram que a Old Navy desistiu rápido demais.

Crédito: Fast Company

"Muitas marcas acham que a inclusão de tamanhos é uma fórmula mágica. Mas é algo muito complexo e, para ser bem feito, precisa respeitar muitas nuances", explica Polina Veksler, cofundadora da Universal Standard, startup que fabrica todas as peças de vestuário em uma ampla tabela de tamanhos.  

A Old Navy informou que muitos de seus tamanhos maiores não esgotaram. Mas Veksler ressalta que pode levar tempo para descobrir exatamente quantas unidades de cada tamanho precisam ser encomendadas e quantas precisam ser oferecidas em cada loja.

"A demanda existe, mas leva tempo para entender sua curva de crescimento e sua economia", ela argumenta. "Não é algo que você pode esperar mudar da noite para o dia."

OS CORPOS GORDOS NÃO VÃO DESAPARECER

Não há como ignorar o fato de que os medicamentos para perda de peso são muito populares no momento. Mas, apesar disso, continuará a existir um mercado robusto para moda inclusiva nos próximos anos.

A triste realidade é que a inclusão de tamanhos maiores era apenas mais uma tendência.

Veksler argumenta que o fato de tantas marcas tradicionais estarem abandonando os consumidores de tamanhos maiores cria oportunidades para as marcas especializadas em tamanhos acima do padrão.

A Universal Standard tem a missão de ajudar a transformar todo o setor da moda para que seja mais inclusivo, por isso Veksler espera que as marcas tradicionais não desistam de seus esforços para conquistar esses clientes. 

"Acredito que as marcas que se comprometerem com uma oferta de tamanhos inclusivos serão as grandes protagonistas daqui a 10 anos se continuarem assim", ela prevê.


SOBRE A AUTORA

Elizabeth Segran, Ph.D., é colunista na Fast Company. Ela mora em Cambridge, Massachusetts. saiba mais