Gol de cabeça: como esse tipo de jogada pode prejudicar o cérebro

Cientistas da Universidade de Columbia descobrem que cabecear a bola no futebol prejudica a função cerebral ao longo do tempo

Créditos: Bob Vector/ master1305/ iStock

Talib Visram 3 minutos de leitura

Embora a palavra futebol venha do inglês “foot” + “ball”, que literalmente se refere à ação de chutar uma bola, alguns dos melhores gols de todos os tempos não foram marcados com os pés, mas sim com a cabeça. Pelé e Zinedine "Zizou" Zidane, por exemplo, marcaram gols de cabeça icônicos em finais de Copas do Mundo.

Acontece que uma crescente quantidade de pesquisas tem sugerido que essa habilidade impressionante não é segura. Há cada vez mais evidências sobre os riscos que os lances de cabeça trazem para a saúde do cérebro.

Um novo estudo que se baseia nessas pesquisas é o primeiro a acompanhar jogadores por um período de vários anos. É também o primeiro a encontrar uma diminuição mensurável na saúde da estrutura e função cerebral entre jogadores que cabeceiam a bola com frequência.

Os dados não comprovam efeitos de longo prazo, mas os autores expressam preocupação de que cabeceios regulares possam levar a distúrbios degenerativos mais tarde na vida.

Crédito: Freepik

Durante um período de dois anos, o laboratório de radiologia da Universidade de Columbia acompanhou 148 jogadores de ligas amadoras. O recorte incluía homens e mulheres, com idades entre 18 e 40 anos, todos jogando pelo menos duas vezes por semana durante pelo menos seis meses do ano.

Eles foram classificados em grupos que cabeceavam a bola menos, os que o faziam de vez em quando e aqueles que usavam a tática com mais frequência. Cada grupo passou por uma série de exames de ressonância magnética ao longo do período para medir a estrutura microscópica do cérebro, ou, basicamente, "a fiação da rede no cérebro", como compara Michael Lipton, professor de radiologia que liderou o trabalho.

Os pesquisadores também realizaram uma série de testes cognitivos para medir a função cerebral, incluindo um teste de memorização de "lista de compras" que examina aprendizado e memória.

MUDANÇAS NA ESTRUTURA DO CÉREBRO

Os resultados foram claros. Aqueles que cabeceavam com mais frequência – cerca de 1,4 mil ou mais vezes durante dois anos – mostraram "mudanças bastante significativas" na estrutura cerebral.

Quanto à função cerebral, essa medida permaneceu relativamente estática entre os cabeceadores frequentes, enquanto entre aqueles que cabeceavam menos, a função chegou a melhorar. 

Lipton diz que esse intervalo entre as mudanças na estrutura cerebral e sua função no dia a dia faz sentido. Ele esperaria que uma alteração na estrutura do cérebro se manifestasse antes de começar a se manifestar na vida diária.

Pelo menos cinco membros da equipe vencedora da Copa do Mundo de 1966 da Inglaterra foram diagnosticados posteriormente com demência.

Isso significa que as pessoas poderiam estar levando suas vidas cotidianas sem necessariamente saber que algo está errado, pois não estão experimentando sintomas óbvios, como concussões.

"A grande questão é se esses resultados são precursores de algo que pode acontecer no futuro" Lipton se pergunta, cuidadoso para não fazer ligações explícitas com distúrbios neurodegenerativos futuros, como demência e ETC (encefalopatia traumática crônica), embora reconheça que elas são possíveis.

"As mudanças que vemos no cérebro certamente podem ser parte de um estágio inicial de algum componente dessa doença", diz ele.

TREINOS MENOS INTENSOS

As preocupações com os riscos de cabecear a bola aumentaram nos últimos anos. Houve alguns casos de jogadores renomados sofrendo de distúrbios cerebrais de longo prazo. Pelo menos cinco membros da equipe vencedora da Copa do Mundo de 1966 da Inglaterra foram diagnosticados posteriormente com demência. Outro jogador inglês, Jeff Astle, morreu aos 59 anos do que foi diagnosticado após sua morte como ETC.

Há cada vez mais evidências sobre os riscos que os lances de cabeça trazem para a saúde do cérebro.

Em resposta, alguns órgãos esportivos começaram a fazer mudanças discretas. No ano passado, a associação de futebol da Inglaterra iniciou um teste de parar de ensinar cabeceio a jogadores com menos de 12 anos. A associação da Escócia reduziu o número de treinos focados em cabeceios para um por semana.

Lipton sugere que os impactos provavelmente são ainda mais perceptíveis no futebol profissional do que nas ligas amadoras, dada a maior velocidade da bola – entre 50 e 55 quilômetros por hora.

Críticos estão cada vez mais pedindo às ligas profissionais que encarem esse problema. Mas, mesmo que as mudanças sejam feitas, provavelmente haveria resistência dos torcedores que acreditam que isso tiraria a graça do jogo.


SOBRE O AUTOR

Talib Visram escreve para a Fast Company e é apresentador do podcast World Changing Ideas. saiba mais