Pesquisa aponta risco à saúde causado por microplástico no corpo humano

Novo estudo indica que pessoas com microplásticos no coração correm maior risco de ataque cardíaco, derrame e morte

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Jessica Hullinger 4 minutos de leitura

Já faz tempo que os cientistas descobriram que os microplásticos podem se infiltrar no corpo humano. Mas eles não sabiam o que a presença dessas minúsculas partículas de plástico poderia significar para a saúde humana. Até agora.

Um novo estudo publicado no "New England Journal of Medicine" descobriu que as pessoas com microplásticos no coração correm um risco maior de ataque cardíaco, derrame e morte.

Os pesquisadores da Itália coletaram amostras de placa carotídea (acúmulo de depósitos de gordura que podem bloquear as artérias) de 257 pessoas submetidas à cirurgia para remoção da placa. Eles procuraram por micro e nanoplásticos e constataram que eles estavam presentes em quase 60% desses pacientes.

Eles conseguiram até mesmo identificar tipos específicos de microplásticos. O polietileno, o plástico mais amplamente utilizado no mundo, foi encontrado em 58% das amostras. O cloreto de polivinila (ou PVC) foi encontrado em cerca de 12%. 

Os pesquisadores também encontraram níveis mais altos de marcadores de inflamação em pessoas cuja placa continha essas partículas, o que é condizente com estudos anteriores, que sugerem que os microplásticos promovem a inflamação. 

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Todas essas descobertas são bastante chocantes, mas os pesquisadores queriam saber como a saúde dos pacientes se comportaria ao longo do tempo.

Por isso, voltaram a examinar essas pessoas três anos depois e descobriram que aquelas cujas amostras de placa continham microplásticos tinham duas vezes mais chances de sofrer ataque cardíaco, derrame ou de morrer do que os outros pacientes. 

"Isso é decisivo", diz Philip Landrigan, epidemiologista e professor de biologia do Boston College, que não participou do estudo. "Há muito tempo, os estudiosos têm dito que essas coisas estão em nossos corpos, mas não sabíamos o que elas faziam."

A pesquisa é um passo em direção a uma melhor compreensão do que está acontecendo no corpo humano enquanto nadamos em um mar de plástico.

As descobertas levam a mais perguntas. Por que algumas pessoas tinham microplásticos em suas placas e outras não? Para começo de conversa, como eles foram parar lá? E se os microplásticos são capazes de fazer isso com o coração e o sistema circulatório, o que podem fazer com outras partes do corpo onde foram encontrados, como os pulmões, o baço ou a placenta? 

"Se eles podem entrar no coração, por que não no cérebro, no sistema nervoso?", pergunta Landrigan. "E quanto aos impactos sobre a demência ou outras doenças neurológicas crônicas?"

Outra grande questão é por que os microplásticos podem causar mais ataques cardíacos e derrames. Os pesquisadores não sabem ao certo e enfatizam que seu estudo não demonstra causalidades, apenas a existência de uma conexão. Mas eles têm um palpite. 

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"Estamos razoavelmente certos de que o problema vem de uma fragilidade da própria placa", diz Giuseppe Paolisso, professor de medicina interna e geriatria da Universidade de Campania Luigi Vanvitelli em Nápoles, na Itália, e um dos autores do estudo. 

"Acreditamos que, devido ao fato de as placas com microplásticos e nanoplásticos terem um grau mais alto de inflamação, esse tipo de placa pode ser rompido com mais facilidade e, uma vez rompido, pode entrar na corrente sanguínea." 

A produção global de plástico está projetada para dobrar até 2040 e triplicar até 2060, e a maior parte desse aumento está nos plásticos descartáveis. "O primeiro passo é reconhecer que o baixo custo e a conveniência dos plásticos são enganosos e que, na verdade, eles mascaram grandes danos", escreveu Landrigan em seu parecer sobre o estudo. 

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Ele pede que os médicos e as instituições médicas apoiem o Tratado Global de Plásticos das Nações Unidas e solicitem um limite global para a produção de plástico. E atribui a culpa pelo aumento dos plásticos diretamente às empresas de combustíveis fósseis. 

"Elas têm consciência de que o mercado de queima de combustíveis fósseis está em declínio, mas têm grandes estoques de petróleo e gás e precisam fazer algo com eles", diz Landrigan. "Por isso, estão fazendo a transição para o plástico." 

Esta nova pesquisa é um passo em direção a uma melhor compreensão do que está acontecendo dentro de nossos corpos enquanto nadamos em um mar de plástico.

"Aposto que outros grupos de pesquisadores de cardiologia vão tentar replicar essas descobertas", prevê Landrigan. "Imagino que este artigo será um catalisador para mais trabalho."


SOBRE A AUTORA

Jessica Hullinger é jornalista especializada em mudanças climáticas, inovação e ciência. saiba mais