Como cuidar dos trabalhadores que ficam depois de uma demissão em massa

Transparência e espaço para vulnerabilidade: especialistas falam sobre estratégias para manter o time unido após um layoff

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Rafael Farias Teixeira 5 minutos de leitura

Até o LinkedIn, conhecida rede social focada em assuntos relacionados ao ambiente de trabalho, teve que recorrer a um layoff — a famosa demissão em massa — em maio, para ajustar as contas em um ambiente imprevisível para as startups e companhias de tecnologia.

A empresa está demitindo 716 funcionários em todo o mundo e encerrando seu aplicativo chinês InCareer, alegando forte concorrência e circunstâncias desfavoráveis.

Apesar de a empresa ter aumentado a receita em 8% ano a ano no trimestre mais recente, o CEO Ryan Roslansky enfatizou a necessidade de “gerenciar despesas” em comunicado feito aos colaboradores. Em seguida, o próprio LinkedIn foi tomado por centenas de posts de surpresa e despedidas, relatos de quem estava saindo, mas também daqueles que ficaram.

Nos últimos meses, esse movimento de demissões em massa se concentrou nas empresas de tecnologia de alto crescimento e nas big techs, que sofrem grande pressão dos acionistas para reduzir custos e aumentar a lucratividade.

o corte de pessoal é a alternativa mais comumente usada pelas empresas para economizar recursos no curto prazo e buscar o equilíbrio de caixa.

Para Cesar Nanci, CEO da plataforma de cultura e engajamento interno Pulses, a alta dos juros básicos que afeta boa parte das grandes economias – incluindo a brasileira – é uma das causas.

"Com menos dinheiro disponível para investir em capital de risco (pois renda fixa está atrativa devido aos juros altos), o combustível de crescimento das empresas mais novas de tecnologia é fortemente afetado", explica.

Com menos dinheiro no mercado, a captação junto aos fundos de capital de risco cai e as empresas precisam sobreviver com os recursos que têm em caixa – considerando que empréstimos bancários estão saindo caro.

Como a maioria das empresas de tecnologia em alto crescimento ainda gasta mais do que recebe e são intensivas em recursos humanos bem remunerados, o corte de pessoal é a alternativa mais comumente usada para queimar menos no curto prazo e buscar o equilíbrio de caixa.

OS QUE FICARAM

Na medida em que o ritmo de crescimento cai ou as operações estabilizam, diminui a necessidade de uma equipe "construtora" e as empresas passam a ter um time mais ajustado para a "manutenção" do status quo, explica Carlos Guilherme Nosé, CEO e sócio do ecossistema de recursos humanos FESA Group. Isso afeta diretamente o número de pessoas necessárias no quadro de funcionários.

"Após períodos de grande crescimento, é normal que as empresas façam alguns ajustes de estrutura. Acredito que o pior já passou. Começamos a ver alguns sinais de melhora da economia em diversos setores", afirma Nosé.

Para lidar com a situação, o RH precisa ter o maior o número de dados relevantes levantados, para construir uma comunicação transparente.

Mesmo com a redução dos episódios de demissão em massa, ainda há muitas questões sendo levantadas sobre a vida pós-layoff. Mas esse não é o único aspecto: há também o desafio de como lidar com as pessoas que permanecem na empresa.

Para lidar com uma demissão em massa, tanto externa quanto internamente, Nanci acredita que o departamento de recursos humanos precisa ter a melhor compreensão possível do contexto no qual a organização está inserida e o maior o número de dados relevantes levantados, para construir uma comunicação constante e transparente.

A partir disso, é hora de trabalhar com um time de gestão de mudança, com agentes e pessoas chaves internas que apoiem o processo.

"É preciso manter um alinhamento constante com a liderança para que se possa trabalhar de forma direcionada com os times, tirando dúvidas e passando informações e orientações necessárias para minimizar os desconfortos. Além do que, essas pessoas são fundamentais para o fortalecimento da cultura da empresa nesses momentos", diz Nanci.

OS QUE SAÍRAM

Para proporcionar uma experiência menos traumática para quem foi dispensando, o ideal é estudar pacotes de apoio, conduzir reuniões respeitosas e fornecer informações direcionadas para motivos e momentos.

"​​É primordial o apoio aos profissionais que passam por esse movimento, dando suporte na recolocação e orientando possíveis caminhos. Isso faz toda diferença e reforça o cuidado das organizações no pilar de pessoas", afirma Fabiana Pauli, head de pessoas da startup de logística Freto.

"Externamente, é muito importante a empresa se posicionar para ajudar esse profissional junto ao mercado, destacando suas qualidades e dando referências e apoio no processo de recolocação."

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Nosé concorda que a transparência é essencial. "A melhor forma é ser sempre transparente e honesto, explicando os pilares de cada decisão. Lembre-se de que, em um cenário de incertezas, seus colaboradores podem se sentir inseguros e se abrirem a propostas de mercado. Os melhores sempre terão ofertas, portanto, mantenha-os perto e engajados com o futuro da empresa", aconselha.

Além de transparência, é preciso reforçar a relevância do alinhamento dos colaboradores com a empresa, principalmente em relação a sua visão, missão e valores. E ficar de olho nos indicadores de engajamento, saída voluntária e nas entregas dos times.

"Momentos de instabilidade geram alteração em processos, projetos e há a necessidade de realinhar compromissos e acordos", diz Nanci.

ESCUTA ATIVA

Outro ponto importante é reservar tempo para ouvir as inseguranças e sentimentos de quem fica. "Layoffs podem gerar muitos sentimentos negativos, impedindo as pessoas de olhar a situação de maneira integral e achar as melhores soluções. Por isso, abrir espaço para os próprios colaboradores sugerirem ideias e estratégias de enfrentamento pode ser uma boa prática”, afirma o CEO da Pulses.

“Muitos funcionários podem já ter passado por situações parecidas em outros empregos e vivências, e podem contribuir para o sucesso da organização", lembra Nanci. Fabiana concorda que é importante preparar e incentivar os líderes para conversar com quem ficou, seja em grupo ou um a um.

"Isso não impede que outros profissionais se assustem e busquem novas oportunidades no mercado. Mas, com certeza, diminuiu muito essa possibilidade", diz a executiva.


SOBRE O AUTOR

Rafael Teixeira Farias tem mais de 14 anos de carreira em jornalismo e marketing digital, além de sete livros de ficção já publicados. saiba mais