Pesquisas subestimam o grau de desinformação que há no Facebook

A maior fonte de desinformação na plataforma não são os links para sites de notícias falsas, mas algo mais básico: as imagens

Crédito: Glen Carrie/ Unsplash

Yunkang Yang, Matthew Hindman e Trevor Davis 4 minutos de leitura

Quanta desinformação circula no Facebook? Vários estudos apontam que a quantidade é baixa ou que o problema tem diminuído ao longo do tempo.

Mas todos eles deixam de fora a maior parte da história.

Como pesquisador de comunicação, mídia e assuntos públicos e fundador de uma empresa de inteligência digital, realizamos um estudo que revela que uma enorme quantidade de desinformação foi negligenciada por outras pesquisas.

A maior fonte de desinformação no Facebook não são os links para sites de notícias falsas, mas algo ainda mais básico: as imagens. E uma parcela significativa delas é enganosa.

Por exemplo, na véspera das eleições presidenciais norte-americanas de 2020, quase um quarto de todas as postagens de imagens políticas na plataforma continham desinformação. Mentiras amplamente compartilhadas incluíam teorias da conspiração, declarações enganosas sobre o movimento Black Lives Matter e alegações infundadas sobre o filho do então candidato Joe Biden, Hunter.

DESINFORMAÇÃO VISUAL EM NÚMEROS

Nosso estudo é o primeiro esforço em grande escala, em qualquer plataforma de mídia social, a medir a prevalência da desinformação em imagens relacionadas à política dos Estados Unidos. As imagens são de extrema importância para análise, pois representam aproximadamente 40% de todas as publicações no Facebook.

Pesquisas anteriores indicam que elas são extremamente impactantes e poderosas. Em posts jornalísticos, são capazes de influenciar a opinião dos leitores, e têm uma maior chance de serem compartilhadas pelos usuários. Além disso, são usadas frequentemente em campanhas de desinformação patrocinadas por Estados autoritários, como as conduzidas pela Agência Russa de Pesquisa da Internet.

Fizemos um estudo abrangente, reunindo mais de 13 milhões de posts contendo imagens no Facebook, entre agosto e outubro de 2020, publicados por 25 mil páginas e grupos públicos.

as imagens postadas no Facebook são tóxicas de maneiras que vão além da simples desinformação. Há inúmeras imagens abusivas, misóginas ou simplesmente racistas.

O público da plataforma está tão concentrado que essas páginas e grupos respondem por pelo menos 94% de todo o engajamento – curtidas, compartilhamentos e reações – relacionado a postagens de imagens políticas. Utilizamos reconhecimento facial para identificar figuras públicas e acompanhamos todo o conteúdo que foi repostado. Em seguida, classificamos amostras aleatórias, bem como as imagens mais compartilhadas.

No geral, nossas descobertas são preocupantes: constatamos que 23% das publicações em nossos dados continham desinformação. De forma consistente com pesquisas anteriores, observamos que a distribuição se dá de maneira desigual, variando de acordo com o espectro político. Enquanto apenas 5% dos posts alinhados à esquerda continham informações falsas, esse número subia para 39% quando a inclinação era à direita.

O tipo de desinformação que encontramos no Facebook era altamente repetitivo e muitas vezes simples. Embora tenhamos encontrado muitas imagens manipuladas, elas eram superadas em número por memes com conteúdo enganoso, capturas de tela de postagens falsas de outras plataformas ou posts que distorciam fotos reais.

Por exemplo, uma foi repetidamente publicada como “prova” de que o ex-apresentador da Fox News, Chris Wallace, era próximo de Jeffrey Epstein, acusado de tráfico sexual de menores. Na realidade, o homem de cabelos grisalhos na imagem não era Epstein, mas sim o ator George Clooney.

No entanto, também fizemos uma descoberta interessante. Estudos anteriores sugeriram que posts contendo desinformação geram mais engajamento. Mas, em nossa análise, não encontramos essa relação.

Controlando o número de assinantes das páginas e o tamanho dos grupos, não encontramos nenhuma correlação entre o engajamento e a presença de desinformação. Constatamos que, apesar de não garantir que o post se tornasse um viral, também não diminuía as chances de isso acontecer.

Outro dado que nos surpreendeu foi o fato de que as imagens postadas no Facebook são tóxicas de maneiras que iam além da simples desinformação. Encontramos inúmeras imagens abusivas, misóginas ou simplesmente racistas.

Nancy Pelosi, Hillary Clinton, Maxine Waters, Kamala Harris e Michelle Obama eram os alvos mais frequentes de abuso. Por exemplo, uma imagem frequentemente repostada insinuava que Kamala Harris era uma “acompanhante de luxo”. Outra foi alterada para fazer parecer que Michelle Obama tinha um órgão genital masculino.

LACUNA PREOCUPANTE NO CONHECIMENTO

Ainda há muito trabalho a ser feito para entender o papel da desinformação visual no cenário político digital. Embora o Facebook continue sendo a plataforma de mídia social mais utilizada, o Instagram e Snapchat recebem mais de um bilhão de imagens por dia. Além disso, o YouTube e o TikTok também são importantes veículos de desinformação política sobre o qual os pesquisadores ainda sabem muito pouco.

Possivelmente, a descoberta mais preocupante do nosso estudo é a extensão do desconhecimento coletivo em relação à desinformação nas redes sociais. Apesar de centenas de estudos terem sido publicados sobre o tema, até agora os pesquisadores não conseguiram identificar a principal fonte de desinformação na maior plataforma de mídia social. O que mais estaríamos deixando passar?

Este artigo foi republicado do The Conversation sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE O AUTOR