Novas tecnologias ajudam a reduzir a perda e o desperdício de alimentos

Segundo a FAO, com o total de alimentos perdidos e desperdiçados no mundo seria possível alimentar 1,26 bilhão de pessoas

Crédito: Connecting Food/ Divulgação

Fábio Cardo 5 minutos de leitura

Em um mundo onde mais de 828 milhões passam fome (dados da ONU de 2021), um terço de todos os alimentos produzidos não é consumido. Cerca de 14% são perdidos entre a colheita e o transporte e quase 17% do que é disponibilizado aos consumidores têm como destino o lixo de varejistas, restaurantes e residências. As informações contam do último relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), intitulado “Índice de Desperdício de Alimentos”.

O World Resourses Institute (WRI) indica que cerca de 41 mil toneladas de alimentos são desperdiçadas por ano no Brasil. Só o setor de bares e restaurantes é responsável por aproximadamente 15% desse total. Em outras palavras, desperdiça-se cerca de seis mil toneladas de alimentos em restaurantes.

Segundo a FAO, que promove o Dia Internacional para a Consciência sobre Perdas e Desperdício de Alimentos em 29 de setembro, a redução da perda e do desperdício representa uma oportunidade de gerar benefícios climáticos imediatos, enquanto melhora a sustentabilidade geral de nossos sistemas alimentares.

Qu Dongyu, presidente da FAO, aponta que reduzir as perdas de frutas e legumes em 50% resultaria na oferta adicional de alimentos suficientes para atender população mundial que passa fome, além de reduzir a emissão de gases de efeito estufa. “Com o total de alimentos perdidos e desperdiçados poderíamos alimentar 1,26 bilhão de pessoas”, afirma.

A TORNEIRA DAS PERDAS ESTÁ ABERTA

Os gases de efeito estufa são gerados em todas as etapas do ecossistema de alimentos, independentemente de o alimento produzido ser consumido ou não. Em particular, os resíduos alimentares que apodrecem nos aterros sanitários geram metano, um potente gás de efeito estufa que tem 84 vezes o poder de aquecimento do dióxido de carbono ao longo de um período de 20 anos.

A perda de alimentos e o desperdício são responsáveis por 8% a 10% das emissões de gases de efeito estufa, contribuindo para um clima instável e eventos climáticos extremos, como secas e enchentes.

Essas mudanças afetam negativamente o rendimento dos cultivos em todo o mundo, reduzem a qualidade nutricional dos alimentos, causam rupturas na cadeia de fornecimento e ameaçam a segurança alimentar.

Novas tecnologias podem dar suporte às práticas para melhorar a gestão dos alimentos. O processamento e a embalagem, junto com o transporte e o desperdício, estão empurrando a cadeia de fornecimento de alimentos para o topo da lista de emissores de gases de efeito estufa em todo o mundo.

FOODTECHS REDUZEM PERDAS E DESPERDÍCIOS

Existem muitas empresas, tecnologias e aplicativos que estão ajudando na redução das perdas e do desperdício. Entre elas, Food To Save, Too Good to Go, Olio, Karma, Nowaste, para citar algumas.

No Brasil, uma das empresas que estão nesta missão é a Connecting Food. Pensando no paradoxo que é a fome e o desperdício de alimentos, a engenheira de alimentos Alcione Silva idealizou a empresa em 2016 – a primeira foodtech de impacto social do Brasil que atua na gestão inteligente de redistribuição de alimentos excedentes.

Atualmente, a empresa atende mais de 380 organizações da sociedade civil (OSCs) em 116 cidades de 15 estados. Trabalha nas cadeias de produção, comercialização e distribuição de alimentos. Entre os clientes que contribuem para a redução dos impactos da fome e todas as suas implicações sociais estão Grupo Pão de Açúcar, iFood, Assaí Atacadista e Nestlé.

Crédito: Connecting Food/ Divulgação

A empresa trabalha com as áreas de perdas, quebra, gestão da qualidade, sustentabilidade e gestão de estoque que fazem uso intensivo desse tipo de dado, inclusive para melhorar seus processos de gestão de perdas e de desperdício de alimentos.

A ferramenta permite que os clientes tenham acesso aos indicadores de desempenho desse trabalho. “Temos indicadores sociais, ambientais e econômicos relacionados às doações de alimentos. Esses dados também ajudam as áreas internas das empresas a ganharem mais eficiência na gestão de perdas”, explica Alcione.

SEGURANÇA E QUALIDADE DOS ALIMENTOS

O sistema tecnológico da Connecting Food não é de garantia de qualidade, e sim de gestão. A qualidade dos alimentos é garantida pelo capital humano, com o treinamento e acompanhamento das equipes, realizando todo o monitoramento das doações.

a redução da perda e do desperdício se alimentos representa uma oportunidade de gerar benefícios climáticos imediatos.

“Dessa forma, garantimos a qualidade dos alimentos que estão sendo doados. Criamos essa rede entre as organizações sociais e as equipes doadoras, que fazem a separação para garantir que cheguem apenas alimentos de qualidade nas organizações sociais”, diz Alcione.

Um bom exemplo é o trabalho que está sendo desenvolvido com o Proença Supermercados, rede com 19 lojas no extremo noroeste do estado de São Paulo. A Connecting Food começou a atender duas lojas no final do ano passado; depois, expandiram para 10. No momento, estão com um projeto em andamento para atingir todas as 19 unidades.

Em quase um ano de trabalho, foi nítida a evolução do Proença Supermercados, não só do ponto de vista das doações em si, mas também no que diz respeito à visão da liderança sobre ESG. A Connecting trouxe para a empresa segurança em relação ao destino das doações, além da organização do processo, que antes era feito de maneira muito informal.

Nesse contexto, foi criado o programa Doação do Bem, com o desenvolvimento de estratégia de comunicação própria. A iniciativa faz parte do pilar social da empresa – algo que, de início, era um tabu, pois a liderança acreditava que a doação de alimentos excedentes não era positiva para imagem corporativa. Com seu trabalho a Connecting destacou o pioneirismo da empresa, considerando seu tamanho e a região atendida.


SOBRE O AUTOR

Fábio Cardo é economista de formação, atua em comunicação empresarial e empreendedorismo e é co-publisher do canal FoodTech da Fast Co... saiba mais