3 lições de marketing do documentário “Pepsi, Cadê meu Avião”, da Netflix

Para CMOs e diretores criativos, o documentário sobre um infame erro de marketing deveria ser mais do que apenas uma nova série para maratonar

Crédito: Netflix/ Divulgação

Jeff Beer 5 minutos de leitura

Acredite ou não, houve uma época em que a Pepsi era uma das marcas mais populares e prolíficas dos EUA. A década de 1990 é recente o suficiente para que suas referências culturais e estratégias de marketing ainda sejam familiares. Mas, quando pensamos que o ambiente de mídia ainda não era fragmentado, faz parecer que foi há quase um século. Os programas de TV, filmes, músicas e, inclusive, anúncios, faziam parte de uma monocultura pop.

Assim, quando foi lançada a campanha “Pepsi Points” na TV, em 1995, todo mundo assistiu. Nela, a empresa prometia dar um jato Harrier de US$ 32 milhões para quem conseguisse juntar 7 milhões de Pepsi Points. Mas quando John Leonard, um estudante de 20 anos, tentou cobrar o prêmio, a Pepsi disse que era tudo brincadeira.

Essa disputa é o tema da série documental da Netflix “Pepsi, Cadê meu Avião”, com uma pitada da nostalgia dos anos 90 que desce tão bem quanto uma latinha de refrigerante.

Crédito: Netflix/ Divulgação

Contada principalmente da perspectiva de Leonard e de seu amigo e mentor Todd Hoffman, a trama lembra o conto de Davi e Golias – um garoto comum que enfrenta uma grande corporação. Mas também é a história de uma estratégia de marketing que deu muito errado, de forma quase absurda.

*ALERTA DE SPOILER

Depois de quase uma década de processos, notícias na mídia e muitas críticas, a Pepsi acabou vencendo o caso na justiça e não precisou dar a Leonard o jato militar de US$ 32 milhões. No entanto, essa não foi exatamente uma vitória para a marca. Desta história podemos tirar algumas lições importantes que qualquer profissional de publicidade, marketing e branding de hoje continua precisando ter em mente.

CONFIE NA EQUIPE DE CRIAÇÃO

No quarto episódio, o diretor de criação da agência BBDO, Michael Patti, revela que o comercial, originalmente, focava em colocar uma criança comum ao lado dos prêmios. Mas os executivos da Pepsi queriam uma imagem de garoto descolado, o que resultou na promessa falsa do anúncio.

Clientes discordam das ideias das agências de publicidade o tempo todo. Mas houve outro erro aqui. O storyboard original era “Jato Harrier por 700.000.000 de Pepsi Points”. Trazer um número absurdamente alto ao lado de uma criança comum deixaria a peça mais engraçada. Mas a Pepsi discordou. Os executivos também acharam que o número era muito grande para caber na tela da TV, então reduziram para 7.000.000.

As marcas contratam agências de publicidade para criar ideias que elas mesmas nunca teriam. Embora certo grau de colaboração seja apropriado, é preciso haver confiança. A Pepsi deveria ter confiado na agência.

Tudo começou a dar errado quando a empresa resolveu diluir a piada. Como Michael Patti disse sobre a mudança de 700 milhões para 7 milhões: “Não é tão engraçado, assim como o garoto não era tão engraçado, e isso levou a um desastre”.

CUMPRA O QUE VOCÊ PROMETE

As marcas precisam ficar atentas para garantir que suas ações realmente reflitam o seu discurso. Quer levantar a bandeira do arco-íris durante o Mês do Orgulho? Pare de fazer doações para políticos que apoiam leis anti-LGBTQIA+.

Assim, se você quer anunciar que são necessários apenas 7 milhões de Pepsi Points para ganhar um jato Harrier, sem nenhum aviso de que é só brincadeira, é bom estar preparado para cumprir a promessa.

O ex-diretor de marketing da Pepsi, Brian Swette, achava ridícula qualquer alegação de que se tratava de uma oferta legítima. “Víamos isso como parte do nosso senso de humor e esperávamos que o público entendesse dessa forma”, alegou.

Esse argumento pode ter sido convincente o suficiente para o juiz Kimba Wood, que acabou dando ganho de causa para a empresa. Quando se trata do julgamento do público, no entanto, é importante lembrar que a letra da lei e a percepção de marca não são a mesma coisa.

Dá para imaginar algo assim acontecendo hoje? A revolta que tomaria conta das redes sociais seria implacável. Os profissionais de marketing devem sempre avaliar com muito cuidado suas expectativas em relação ao público e estar preparados para qualquer tipo de reação. Se o pior acontecer, não use essas expectativas como desculpa. O que nos leva à terceira e última lição.

LIDERE COM GENEROSIDADE

Outra famosa campanha de pontos da década de 1990 foi a promoção do Banco Imobiliário do McDonald’s, que sofreu com fraudes milionárias e ganhou um documentário em 2020, a série “McMillions”, da HBO.

É muito fácil apelar para o cinismo e ver a alegação de Leonard como uma tentativa de ganhar dinheiro explorando legalmente uma brecha na publicidade. Mas o cinismo não deve ser o ponto de partida de nenhuma marca.

A Pepsi ofereceu a Leonard cerca de US$ 1 milhão para desistir do processo. Ele considerou isso como um insulto que o encorajou ainda mais a continuar lutando pelo seu prêmio. O jovem começou a aparecer em grandes emissoras de TV, participando de noticiários, talk shows e outros programas, fazendo com que a Pepsi parecesse uma vilã aos olhos do público.

Vamos imaginar por um segundo que, em vez de tratá-lo com condescendência, a marca tivesse explicado o caso, assumido o erro e convidado Leonard a se tornar um colaborador, dando a ele um prêmio em dinheiro, um suprimento vitalício de Pepsi e um passeio em um jato Harrier.

A marca não apenas poderia colher os frutos das ações de relações públicas como também teria um ótimo material para outro anúncio. A Pepsi poderia ter resolvido as coisas com muito mais rapidez e facilidade, se tivesse agido com um pouco de humildade e generosidade com seu fã.


SOBRE O AUTOR

Jeff Beer cobre publicidade, marketing e criatividade para a Fast Company. saiba mais