Procrastinação e a culpa das empresas na falta de engajamento das pessoas

Adiamento de tarefas necessárias em favor de atividades mais agradáveis é um hábito que frequentemente resulta em atrasos e estresse

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Genesson Honorato 4 minutos de leitura

Era uma manhã ensolarada, temperatura agradável e café fresquinho no escritório, além do videogame, da piscina de bolinha. Todo o cenário estava pronto para mais uma semana de trabalho, porém, algo estava errado.

Sarah, uma profissional talentosa, se via presa em uma armadilha de procrastinação. Os minutos se arrastavam enquanto ela se distraía com tudo o que aparecia à sua frente. As redes sociais eram uma das principais vilãs.

Sarah estava desmotivada e cada clique no mouse era uma fuga da responsabilidade que estava bem ali à sua frente. Recados não respondidos se acumulavam, testemunhas silenciosas de uma  batalha contra ela mesma.

A procrastinação pode ser uma válvula de escape dos colaboradores para evitar o desânimo por não se sentirem conectados ao ambiente de trabalho.

Era como se o tempo passasse cada vez mais rápido naquele escritório, enquanto a tarefa urgente permanecia adiada, esperando por um momento que nunca chegava.

Definida como o adiamento de tarefas necessárias em favor de atividades mais agradáveis, a procrastinação é um hábito que frequentemente resulta em atrasos e estresse, afetando várias áreas da vida, incluindo o desempenho no trabalho.

No contexto relatado acima, que é a realidade de muita gente, se traduz em algo muito mais profundo do que só adiar uma tarefa e passá-la para outro dia. Para a personagem fictícia Sarah, é uma resposta a um ambiente de trabalho que pode não estar sendo estimulante da maneira correta para aproveitar todo o seu potencial.

Embora a procrastinação seja uma ação individual, é por vezes influenciada também por fatores externos, incluindo o ambiente de trabalho e a cultura organizacional.

DESCONEXÃO E DESENGAJAMENTO

A falta de engajamento pode ser o resultado da falta de clareza sobre a visão das metas e propósitos da organização, transformando a procrastinação em uma válvula de escape dos colaboradores para evitar o desânimo por não se sentirem conectados àquele ambiente.

As horas se arrastam, as metas ficam à deriva e as tarefas são adiadas em favor de distrações momentâneas, se transformando em uma verdadeira bola de neve de angústia e desespero.

O cenário atual não facilita. As distrações online se tornaram uma das principais causas da procrastinação, em grande parte devido à economia da atenção, que busca o tempo inteiro tirar as pessoas do controle do seu foco, tornando a atenção difusa e desconectada do que realmente precisa ser feito.

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A facilidade de acesso à informação, que vem causando uma verdadeira infodemia – ou seja, uma verdadeira epidemia de informação – torna o cenário ainda mais complexo. Tarefas onde o porquê não esteja claro, ou que não façam sentido naquele momento, fazem o cérebro buscar uma fuga para algo mais prazeroso. A dopamina oferecida pelos likes e pela rolagem infinita se torna a fuga perfeita.

A facilidade de "desconexão" dos colaboradores com suas responsabilidades pode também indicar sintomas de problemas mais amplos que a empresa talvez não tenha identificado, agravando ainda mais a situação.

Em uma analogia à empresa como um grande oceano, a procrastinação é como um iceberg: o que você vê na superfície é apenas a ponta. Os problemas mais amplos estão abaixo da água.

O QUE ESTÁ ABAIXO DA PONTA DO ICEBERG?

Na cultura organizacional, vários fatores podem levar uma pessoa a se tornar desengajada e propensa a procrastinar. A falta de reconhecimento e valorização é uma delas. Isso faz com que os colaboradores se sintam facilmente substituíveis, o que resulta em desmotivação.

A comunicação difusa ou ausente também gera confusão sobre metas e expectativas, dificultando o alinhamento com os objetivos das equipes e da empresa.

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Outro ponto de atenção é não checar com frequência o nível de toxicidade do ambiente de trabalho, marcado por competições desenfreadas, bullying e até discriminação de pessoas e grupos minorizados.

Esses fatores contribuem para que a confiança dos funcionários na empresa seja minada, levando a uma falta de identificação, comprometimento e produtividade. O principal efeito disso, além do adoecimento mental, é mais procrastinação.

Assim como no filme "O Segredo do Meu Sucesso", de 1987, no qual o protagonista busca oportunidades fora de sua função atual devido à insatisfação com o ambiente de trabalho, as empresas precisam estar atentas a sinais de desengajamento.

Tarefas onde o porquê não esteja claro, ou que não façam sentido naquele momento, fazem o cérebro buscar uma fuga para algo mais prazeroso.

Quando os funcionários não encontram espaço para suas ideias dentro da organização, podem buscar alternativas externas para expressar seu potencial. Ou seja, é um sinal de que a empresa precisa agir rapidamente para valorizar e reter os seus talentos. 

Para alcançar o objetivo de reduzir a procrastinação e a falta de engajamento, as lideranças podem implementar programas de reconhecimento regular, oferecer feedback construtivo e recompensas tangíveis para celebrar o sucesso dos funcionários. Além disso, devem estabelecer comunicação transparente, definindo claramente metas e expectativas.

Investir em oportunidades de desenvolvimento profissional, fomentar uma cultura colaborativa e inclusiva e apoiar o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal também são fundamentais para manter os funcionários motivados e comprometidos. Isso tudo de maneira customizada, pois as formas de engajar podem ser diferentes para cada perfil profissional.

Não é nada simples, mas empresas visionárias não apenas constroem produtos ou oferecem serviços: elas constroem culturas onde o tempo é aproveitado, os talentos são valorizados e a procrastinação se torna um desafio superável.


SOBRE O AUTOR

Genesson Honorato é Especialista em RH, Professor, Mentor, Palestrante e TEDx Speaker. saiba mais