Redes sociais confundem seguidores, fãs e haters, diz Jack Conte

De acordo com o músico e cofundador da plataforma Patreon, graças aos algoritmos está mais difícil a ligação entre audiência e criadores

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Camila de Lira 3 minutos de leitura

O botão de seguir mudou a internet e pode transformar novamente a relação das pessoas com o digital. Dos blogs pessoais aos vídeos do TikTok, Jack Conte testemunhou a evolução da internet. O músico e cofundador do Patreon, site de financiamento coletivo que cria serviços de assinatura de conteúdo, encerrou esta edição do South by Southwest (SXSW) e traçou a evolução da web desde as origens, quando capacitou o compartilhamento, até o cenário atual, de ameaça à liberdade criativa.

Antes de fundar a plataforma de financiamento coletivo, Conte liderou a banda Pomplamoose, um dos fenômenos do YouTube entre 2008 e 2010. Por meio de vídeos na plataforma, ele conquistou público e uma base de seguidores leais, que enchia shows e até criava capas de álbum.

"A cultura de seguir pessoas é a arquitetura fundamental da criatividade humana e da organização das artes", diz. O Patreon oferece a criadores a capacidade de criar sistemas próprios de assinatura.

Em redes como YouTube e Instagram, o botão de "assinar"/"seguir" perdeu peso com os anos devido aos sistemas de ranking. No começo da década de 2010, as plataformas passaram a privilegiar análises de postagens a partir do engajamento que elas poderiam trazer. Voltado para aumentar o tempo que os usuários passavam em suas redes, o algoritmo de ranking quebrou a ideia de seguidores.

Crédito: Hutton Supancic/ SXSW

"Para o modelo de negócios do Facebook, foi ótimo. Mas foi péssimo para os criadores. O canal direto entre fãs e artistas se quebrou. Porque, pela primeira vez desde a web 2.0, seguidores e fãs passaram a não receber as postagens e vídeos feitos por artistas", apontou.

A alteração também teve impactos no tipo de vídeos, imagens e textos produzidos nessas redes. No lugar de criar pensando na sua própria audiência ou em seus próprios seguidores, os artistas passaram a usar a criatividade com critérios "obscuros" do algoritmo. 

A cultura de seguir pessoas é a arquitetura fundamental da criatividade humana e da organização das artes

Em outras palavras, criadores e artistas estavam criando conteúdo para os algoritmos das redes e não mais para a sua comunidade de fãs. Criar para "maximizar a atenção" da audiência não é a mesma coisa que criar para se conectar com os fãs, explicou Conte. 

E então veio o TikTok com o modelo de "for you" ("feito para você"). Os vídeos que aparecem nesse feed não são escolhidos pelos usuários, mas pelo próprio algoritmo do TikTok, que faz análises dos gostos – e, principalmente, dos assuntos odiados – da pessoa e filtra quais tipos de vídeo fazem sentido para aquele usuário. 

O cofundador da Patreon é também músico. Parte de sua apresentação no SXSW foi, exatamente, falando sobre os sucessos que sua banda, Pomplamoose, teve ao publicar músicas e vídeos online.

Nos últimos três anos, Conte sentiu o que muitos criadores pelo mundo passam: está mais difícil se conectar com os fãs. "É mais difícil vender ingressos para o show. É mais difícil criar uma comunidade e energizar os fãs. Até canais de mídia estão tendo dificuldade de encontrar a sua audiência fiel."

O desabafo de Jack Conte foi recebido e apoiado pela plateia do SXSW. Muitos aprovaram com a cabeça quando o executivo da Patreon contou sobre as barreiras que sentia como criador. Nas conversas paralelas, o que se escutava na audiência de Austin era "achei que fosse só comigo". 

O futuro pode ser diferente. Para Conte, a próxima década será marcada pela reconexão entre artistas e audiência. Startups como Fourthwall e Kajabi estão se destacando por ligar os criadores de conteúdo com o seu público cativo. São poucos e bons, capazes de financiar o projeto daqueles que realmente gostam.

"Eu lembro como era criar antes dos algoritmos. Tem um jeito melhor de a arte existir na internet", finalizou.


SOBRE A AUTORA

Camila de Lira é jornalista formada pela ECA-USP, early adopter de tecnologias (e curiosa nata) e especializada em storytelling para n... saiba mais