Ciência aponta que ser feliz tem menos a ver com a idade e mais com bem-estar

Em comunidades não industrializadas, pesquisadores observaram que o gráfico da felicidade ao longo da vida nem sempre obedece à lógica da curva em U

Crédito: Tkirkgoz/ Pexels

Michael Gurven 2 minutos de leitura

A felicidade ao longo da vida tem sido descrita popularmente através da imagem de um gráfico com uma curva em U: as alegrias da juventude são seguidas pelos desafios dos 20 e 30 anos que, por sua vez, são seguidas por uma melhora mais tarde na vida – atingindo seu pico após a aposentadoria.

Acontece que, embora isso possa ser verdade – ou não – em países mais ricos, não se aplica a sociedades de baixa renda e não industrializadas. Essa é a principal conclusão de um estudo que liderei e que analisou o envelhecimento em comunidades rurais, voltadas para a subsistência, em 23 países do Sul Global.

Os resultados dessa pesquisa têm implicações importantes para a saúde global, já que as populações estão envelhecendo e a insegurança econômica é crescente.

No nosso estudo, descobrimos que os níveis de felicidade ao longo da vida não seguiram de forma consistente a trajetória em U, observada em geral nas sociedades industrializadas. Em alguns casos, até houve uma curva em U.

Mas, mais frequentemente, o que observamos foi uma curva invertida em U, onde adultos de meia-idade relataram o maior nível de felicidade. Ou, então, não identificamos nenhuma tendência significativa e específica relacionada à idade.

De modo geral, o bem-estar muitas vezes caiu após a meia-idade em populações carentes de recursos, que não têm segurança social nem outras formas de proteção institucionalizadas. Isso se alinha a pesquisas anteriores feitas em países de baixa renda e até mesmo em nações mais ricas durante crises econômicas.

No entanto, a idade em si foi um indicador fraco de satisfação com a vida em qualquer um desses lugares. Doenças, deficiência e a perda de produtividade são fatores capazes de explicar melhor o bem-estar de uma pessoa do que a idade.

Na verdade, os poucos efeitos positivos da idade que encontramos geralmente desapareciam quando incluíamos medidas dessas adversidades na nossa análise.

Junto com outros estudos que mostram uma queda no bem-estar entre adolescentes e jovens adultos nos últimos anos, a pesquisa questiona a suposição de que a curva da felicidade em U é universal.

A tendência de que o bem-estar médio melhora após a meia-idade pode ser mais comum em sociedades urbanas e afluentes, com aposentadoria formal e fortes redes de proteção para os adultos mais velhos.

Ao examinar uma gama mais ampla de contextos, conseguimos entender melhor como fatores ambientais e socioeconômicos moldam a felicidade ao longo da vida, oferecendo uma perspectiva mais detalhada sobre a felicidade, que pode guiar políticas para diferentes faixas etárias e culturas.

Entender o bem-estar em diversas culturas é crucial, especialmente diante das crises globais de envelhecimento e de saúde mental. Ao reconsiderarmos os determinantes da felicidade fora do modelo da curva em U, todos estaremos mais bem preparados para melhorar a qualidade de vida das diferentes populações pelo mundo.

Este artigo foi republicado do "The Conversation" sob licença Creative Commons. Leia o artigo original


SOBRE O AUTOR

Michael Gurven é professor de antropologia na Universidade da Califórnia. saiba mais