Mais essa, agora: calor extremo pode nos fazer envelhecer mais rápido

Além dos riscos imediatos, as altas temperaturas podem estar acelerando o processo de envelhecimento, com impactos de longo prazo na saúde pública

Crédito: amygdala_imagery/ Getty Images

Eunyoung Choi 4 minutos de leitura

E se o calor extremo não apenas deixasse você exausto, mas também fizesse seu corpo envelhecer mais rápido?

Já sabemos que altas temperaturas aumentam o risco de insolação, doenças cardiovasculares, problemas renais e até morte. No entanto, poucos estudos haviam explorado como o calor afeta o envelhecimento biológico – ou seja, o desgaste natural das células e tecidos que nos torna mais vulneráveis a doenças associadas à idade.

Um novo estudo publicado por minha equipe na revista “Science Advances” sugere que a exposição prolongada a temperaturas extremas pode acelerar o envelhecimento biológico em nível molecular. Isso levanta preocupações sobre os impactos de longo prazo das mudanças climáticas na saúde da população.

Para investigar essa relação, analisamos amostras de sangue de 3,6 mil adultos em várias regiões dos EUA e utilizamos “relógios epigenéticos” para medir a idade biológica de cada um. Esses relógios identificam padrões de modificação no DNA (metilação), que mudam conforme envelhecemos.

A metilação do DNA é um processo químico que funciona como um interruptor, ativando ou desativando genes. Fatores ambientais podem influenciar esse mecanismo e alterar o funcionamento dos genes ao longo do tempo, afetando tanto o envelhecimento quanto o risco de doenças.

Pesquisas anteriores mostraram que, em camundongos, uma única exposição ao calor extremo pode causar mudanças duradouras na metilação do DNA em vários tecidos. Para testar esse efeito em humanos, cruzamos os dados epigenéticos com registros climáticos e analisamos se pessoas que vivem em regiões mais quentes apresentam um envelhecimento biológico acelerado.

Nossos resultados indicam que adultos mais velhos que vivem em áreas com muitos dias de calor extremo envelhecem mais rápido, em termos epigenéticos, do que aqueles em regiões mais amenas. 

Por exemplo, participantes que moram em locais com pelo menos 140 dias de calor intenso por ano – definidos como dias em que o índice de calor ultrapassa 32°C – apresentaram até 14 meses de envelhecimento biológico a mais em comparação com aqueles que vivem em regiões onde a temperatura atinge esse nível menos de 10 vezes ao ano.

ícone de pessoa sob calor extremo indicado por termômetro

Essa relação entre calor extremo e envelhecimento biológico se manteve mesmo depois de considerarmos fatores como nível de atividade física e status socioeconômico. Isso significa que, mesmo entre pessoas com estilos de vida semelhantes, aquelas que vivem em regiões mais quentes podem estar envelhecendo mais rápido.

Outro achado surpreendente foi a magnitude desse efeito: a exposição ao calor extremo teve um impacto no envelhecimento comparável ao do tabagismo e do consumo excessivo de álcool. Isso sugere que o calor pode estar silenciosamente afetando a longevidade da população, assim como outros fatores ambientais e comportamentais já conhecidos.

IMPACTOS DE LONGO PRAZO NA SAÚDE PÚBLICA

Embora nosso estudo revele novas conexões na relação entre calor extremo e envelhecimento biológico, ainda há muitas perguntas sem resposta. É importante ressaltar que nossos achados não significam que cada ano adicional de exposição ao calor extremo equivale diretamente a 14 meses extras de envelhecimento biológico.

A pesquisa analisou diferenças populacionais com base na exposição ao calor em diferentes regiões. Ou seja, tiramos um retrato da população em um determinado momento, sem acompanhar os efeitos individuais ao longo do tempo.

Além disso, não conseguimos avaliar todos os fatores que podem ajudar as pessoas a se protegerem do calor. O acesso ao ar-condicionado, o tempo gasto ao ar livre e a exposição ao calor no ambiente de trabalho são variáveis que influenciam os impactos individuais da temperatura extrema.

Enquanto algumas pessoas podem ser mais resistentes, outras estão mais vulneráveis devido a condições de saúde preexistentes ou barreiras socioeconômicas. Esse é um tema que precisa ser mais estudado.

O que já sabemos, no entanto, é que o calor extremo não é apenas um risco imediato – ele pode estar acelerando o envelhecimento, trazendo consequências preocupantes para a saúde pública.

Os idosos são especialmente vulneráveis, pois o envelhecimento reduz a capacidade do corpo de regular a temperatura. Além disso, muitos tomam medicamentos como betabloqueadores e diuréticos, que podem diminuir ainda mais a tolerância ao calor, dificultando a adaptação a temperaturas elevadas.

Para enfrentar esse problema, é essencial criar estratégias para proteger as populações mais vulneráveis, especialmente os idosos, garantindo que possam viver com segurança em suas comunidades. Somente assim poderemos mitigar os efeitos invisíveis, mas profundos, do calor extremo na saúde da população.

Este artigo foi republicado do “The Conversation” sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE A AUTORA

Eunyoung Choi é pós-doutoranda em gerontologia na Universidade do Sul da Califórnia. saiba mais