Pegadinha de bilhões: “morte” da mascote do Duolingo chocou até Dua Lipa

Empresa alcança 1,7 bilhão de visualizações nas redes ao “matar” e depois ressuscitar sua coruja. Entenda como essa campanha virou um fenômeno

Créditos: Imagem criada com IA/ Reprodução Instagram

Grace Snelling 7 minutos de leitura

Depois de mais de uma década desenvolvendo sua mascote, a coruja Duo – que começou como um desenho simpático e virou uma estrela nas redes com milhões de seguidores –, o Duolingo resolveu fazer o impensável: matou o personagem.

O que parecia uma decisão arriscada acabou rendendo à empresa a campanha mais bem-sucedida da sua história – e talvez até uma das ações de maior alcance já feitas por qualquer marca.

Criado em 2011, o mesmo ano em que o Duolingo foi fundado, Duo começou como um simples logotipo. Com o tempo, virou um personagem completo: carismático, um pouco caótico, com amigos, rivais, uma crush famosa e uma legião de fãs.

Mas, no dia 11 de fevereiro, a empresa anunciou que Duo havia morrido – atropelado por um Cybertruck da Tesla, como os fãs descobririam depois. A ideia da equipe de marketing era simples: trocar o ícone do app (com a imagem do Duo “morto”, com X nos olhos) e postar três vídeos nas redes sociais. Fim da ação.

Só que a reação foi muito maior do que o esperado. O anúncio viralizou no TikTok, gerando milhares de comentários aflitos, vídeos-resposta de outras marcas e até matérias em telejornais.

Com toda a repercussão, a equipe de mídia social decidiu transformar a brincadeira em uma campanha global. Em poucos dias, reuniram os setores de marketing, de produto e de engenharia para expandir a ideia com anúncios segmentados por público, ações no aplicativo, produtos exclusivos e parcerias.

“Era para ser só três posts e seguir a vida – mais um dia normal no Duolingo”, brinca Zaria Parvez, gerente de redes sociais e a mente por trás da estratégia no TikTok.

mascote do Duolingo com X no  lugar dosolhos
Crédito: Duolingo

Entre a “morte” e a revelação de que tudo não passava de uma ação de marketing, a campanha acumulou impressionantes 1,7 bilhão de impressões nas redes sociais da empresa em apenas duas semanas.

Apesar de ousada, a campanha seguiu a fórmula que o Duolingo vem aperfeiçoando há anos: arriscar, agir rápido e, acima de tudo, contar uma boa história. Para muitas marcas, matar a própria mascote pareceria forçado. Mas, com Duo, fez total sentido.

PRIMEIRO DOENTE, DEPOIS MORTO

Nos meses anteriores, o personagem já havia passado por várias situações bizarras: foi assado na grelha, triturado no liquidificador e até ficou gravemente doente. Mas essa foi a primeira vez que “morreu”. Tudo isso faz parte da persona caótica que Duo construiu nas redes.

No começo, a coruja só mandava lembretes no app – pedindo (ou melhor, implorando) para os usuários não esquecerem de fazer as lições. Mas a internet transformou isso em meme, e o Duolingo decidiu entrar na brincadeira.

Desde então, a mascote se tornou protagonista nas redes da marca, com um universo próprio de personagens secundários e histórias cada vez mais absurdas. Seu lema é simples: fazer qualquer coisa para que você termine a lição – até ameaçar sequestrar sua família ou fazer os cachorros do escritório da empresa de reféns.

Essa abordagem inusitada fez com que o Duolingo alcançasse um novo nível de relevância nas redes: só no TikTok, foram mais de seis milhões de novos seguidores em um ano e um salto de 80% nas visualizações.

Agora, a personalidade “descontrolada” de Duo também aparece no próprio aplicativo e em colaborações com outras marcas. Parte da estratégia era trocar o ícone do app por versões bizarras, como forma de chamar atenção e trazer os usuários de volta.

No fim de 2023, Duo apareceu com o rosto “derretido”. Em setembro de 2024, ficou com cara de doente: olhos vermelhos, nariz escorrendo – o que gerou preocupação em muitos fãs.

mascote do Duolingo com o rosto derretido
Crédito: Duolingo

“Duo está literalmente doente de tanto lembrar as pessoas de fazerem suas lições”, disse um porta-voz. “Mas não se preocupe, os sintomas não são contagiosos – desde que você mantenha a rotina.” Essa versão do ícone rendeu 30 milhões de impressões no Instagram e no TikTok.

Com o sucesso, a equipe quis ir ainda mais longe.

ATROPELADO POR UM CYBERTRUCK

Em janeiro, a equipe de produto começou a pensar em uma nova mudança ousada no ícone. Foi aí que Gregory Hartman, diretor de arte, sugeriu: “e se a gente matasse Duo?”.

Com o aval de Zaria Parvez, a ideia foi levada ao CEO, Luis von Ahn. Ele não só aprovou como deu o sinal verde: “acabem com ele”. O anúncio foi feito com um comunicado sóbrio, em preto e branco: “Duo, também conhecida como a coruja do Duolingo, morreu.”

No dia seguinte, foi revelado que ele havia sido atropelado por um Cybertruck – uma cutucada bem-humorada em Elon Musk. Três dias depois, a conta oficial do X/ Twitter publicou: “todos os pássaros vão para o céu”, com imagens do antigo logo do Twitter e de Duo morto. Ao que Duolingo respondeu: “os dois foram mortos por um Cybertruck. Descansem em paz.”

A escolha do veículo não foi por acaso. “Cybertrucks são estranhos. Parecia o tipo de coisa que aconteceria com o Duo”, explica Parvez.

Em um terceiro vídeo, dois personagens colocam o caixão de Duo na caçamba de uma caminhonete. Essa seria a última postagem da campanha. Mas a internet queria mais.

Marcas como KitKat, Subway, BuzzFeed, Hilton e T-Mobile apareceram nos comentários prestando homenagens. O youtuber mais popular do mundo, Mr. Beast fez seu próprio vídeo (que já acumula mais de 96 milhões de visualizações).

E então veio o momento que o Duolingo tanto sonhava: a popstar Dua Lipa respondeu. Uma das características mais marcantes de Duo é seu amor platônico pela cantora. Perto do Dia dos Namorados, ela tuitou: “Til’ death duo part” (Até que a morte nos separe, em português – fazendo um trocadilho com o nome do personagem).

Para agradecer, o Duolingo enviou a ela um kit com uma caixinha de “cinzas do Duo” (na verdade, matcha em pó). Internamente, foi uma festa. Parvez recebeu no Slack uma mensagem do CEO: “a Dua Lipa tuitou sobre a gente!”.

caixa com as cinzas da mascote do Duolingo
Crédito: Duolingo

OUTROS PERSONAGENS NÃO ESTAVAM A SALVO

Com os vídeos bombando, a equipe decidiu ir além. Começaram a “matar” outros personagens do universo de Duo nas postagens seguintes. Logo depois, lançaram pelúcias temáticas em parceria com seus fornecedores – com embalagens em formato de caixão.

E a campanha se espalhou pelo mundo. Usando suas 13 contas internacionais, o Duolingo criou versões regionais da história para engajar diferentes públicos.

Crédito: Divulgação

No Brasil, por exemplo, a morte de Duo foi contada em vídeos no estilo de novela. A marca também tinha uma grande campanha com o McDonald’s programada para o mesmo período – o que preocupou a rede de fast-food.

Mas a equipe de marketing deu um jeito de juntar as duas coisas: Duo apareceu em um programa de fofocas para anunciar, ao mesmo tempo, sua "ressurreição e a parceria.

MASCOTE DO DUOLINGO DE VOLTA À VIDA

Claro que Duo não ia ficar “morto” para sempre. Mas, com tanta repercussão, a volta precisava fazer sentido. A solução foi conectar a campanha ao propósito do aplicativo e envolver os usuários.

No fim de semana após o primeiro post, engenheiros do Duolingo criaram um site que somava os XP (pontos de experiência) acumulados pelos usuários ao completarem as lições – de 20 a 35 XP por lição.

A proposta era “traga Duo de volta antes que seja tarde demais”. Para isso, era preciso acumular 50 bilhões de XP no total. O site mostrava o ranking por país, incentivando a competição entre os usuários.

Crédito: Duolingo

A empresa não vai divulgar os números exatos do impacto no app antes do relatório do primeiro trimestre (previsto para 1º de maio), mas confirmou que houve “um aumento significativo na quantidade de usuários ativos”.

Exatamente duas semanas depois da “morte” da mascote, a missão foi cumprida. Duo voltou com um novo ícone – com os olhos brilhando – e um vídeo no TikTok ao som da música “YEAT”, de VVV e Playboi Carti.

Em um vídeo posterior, Duo explicou tudo: “sempre tive dois objetivos: fazer as pessoas estudarem e ser notado pela Dua Lipa”, disse. “Nenhum dos dois estava dando certo. Então precisei fazer algo radical. Pensei: por que não matar um pássaro com duas cajadadas?”.

Por enquanto, a equipe continua comemorando o sucesso da campanha. De fora, parece difícil imaginar como superar algo assim. Afinal, não é todo dia que uma empresa pode matar sua mascote.

Mas Parvez pensa diferente. “Sempre bate aquele medo de ‘será que vamos conseguir fazer melhor?’”, diz ela. “Mas, ao mesmo tempo, isso é animador. Mostra que, mesmo depois de cinco anos criando conteúdos malucos, conseguimos alcançar um nível global. Acredito que o melhor ainda está por vir.”


SOBRE A AUTORA

Grace Snelling é colaboradora da Fast Company e escreve sobre design de produto, branding, publicidade e temas relacionados à geração Z. saiba mais