Adoção de IA faz com que empresas valorizem mais as “soft skills” humanas

Professor da escola de negócios analisa uma nova pesquisa que mostra como a IA afeta a contratação

Crédito: Fast Company Brasil

Peter Cardon 4 minutos de leitura

O recente turbilhão interno na OpenAI teve origem em um confronto entre os tecno-otimistas e aqueles que estão mais hesitantes sobre como será o futuro impulsionado pela IA. Uma versão reduzida dessa mesma batalha está ocorrendo nos ambientes profissionais, conforme as empresas vão incorporando as tecnologias de inteligência artificial em seus fluxos de trabalho.

Vários funcionários e gerentes estão entusiasmados com a forma como a IA pode tornar seu trabalho mais fácil e eficiente. Mas outros estão preocupados com a possibilidade de a tecnologia substituir pessoas, reduzir a criatividade e a engenhosidade e criar locais de trabalho mais centrados nas máquinas e menos humanizados.

Prevejo que a integração da IA exigirá que os ambientes profissionais se tornem ainda mais centrados no ser humano.

Minha pesquisa mais recente mostra que, na era da IA, os empregadores apostam na valorização das "habilidades sociais" que melhoram as interações humanas e promovem uma cultura corporativa centrada nas pessoas. Eles acreditam que a IA vai funcionar melhor quando for usada para aprimorar os talentos dos funcionários e ajudar a desenvolver a conexão humana.

as virtudes mais valorizadas nos ambientes profissionais onde a IA estiver mais integrada ao trabalho serão a ética, a integridade e o caráter

Em um estudo recente, meus colegas e eu fizemos uma pesquisa com quase 700 líderes corporativos sobre quais habilidades os funcionários precisarão ter à medida que a IA se enraizar. Os participantes vieram de diversos setores e cargos. Cerca de metade era dos EUA, e o restante era da Alemanha, Índia, Finlândia e outros países.

No ano passado, também tive várias conversas com líderes empresariais e especialistas em comunicação sobre como a IA generativa está transformando os espaços de trabalho.

À medida que os funcionários e as empresas se esforçam para se manterem competitivos, alguns estão reforçando suas habilidades técnicas. A pesquisa sugere que os funcionários e as empresas devem priorizar o desenvolvimento de habilidades interpessoais, especialmente em relação à ética e à comunicação interpessoal.

ÉTICA 

Nossa pesquisa com líderes empresariais descobriu que as virtudes mais valorizadas nos ambientes profissionais onde a IA estiver mais integrada ao trabalho serão a ética, a integridade e o caráter.

Quando perguntados sobre quais habilidades se tornarão mais importantes na era da inteligência artificial, a resposta número um foi integridade, com 78% dos usuários frequentes de IA prevendo que a importância dessa qualidade vai aumentar. 

A integridade veio seguida de outros traços relacionados ao caráter, incluindo visão estratégica, capacidade de inspirar outras pessoas e motivação. Atribuo isso ao fato de que a incorporação da IA exige uma supervisão cuidadosa, baseada em valores morais elevados e na confiança interpessoal.

Para promover a confiança e a integridade, as empresas devem facilitar conversas abertas sobre as implicações éticas da IA, para que possam estabelecer políticas eficazes, orientadas por valores empresariais centrados no ser humano.

Os líderes também precisam ser transparentes sobre as complexidades éticas envolvidas na introdução da IA no local de trabalho. Em minhas conversas com executivos, eles relataram que a transparência ajuda os membros da equipe a se sentirem confiantes de que seus chefes estão agindo no melhor interesse deles. 

Por exemplo, a empresa de um executivo criou uma força-tarefa composta por funcionários com diversas especializações para ajudar a moldar a política de IA. Essa abordagem colaborativa demonstra que os pontos de vista dos trabalhadores são valorizados e considerados na tomada de decisões. 

COMUNICAÇÃO 

Embora as habilidades de comunicação sempre tenham sido importantes para os empregadores, os tipos de habilidades que são valorizadas vão mudar. Minha pesquisa apontou que 72% dos usuários frequentes de IA acreditam que a comunicação oral se tornará mais importante, enquanto 50% acham que a comunicação escrita terá menos valor conforme a IA se tornar mais capaz de escrever convincentemente de forma humana. 

Os líderes precisam ser transparentes sobre as complexidades éticas envolvidas na introdução da IA no local de trabalho.

A comunicação oral é a melhor maneira de as pessoas demonstrarem compaixão, inspiração, criatividade, sinceridade e outras características humanas. Para desenvolver habilidades de comunicação oral, as pessoas devem se concentrar em aumentar sua capacidade de manter conversas profundas e significativas, facilitar discussões sobre solução de problemas e fazer apresentações mais interativas.

Como a IA lida melhor com a escrita, será cada vez mais importante que as organizações priorizem as interações cara a cara e síncronas como experiências genuínas, nas quais a tecnologia desempenha um papel limitado. 

SOFT SKILLS CENTRADAS NO SER HUMANO 

Embora muitos temam que a IA transforme os locais de trabalho em ambientes sem alma, minha pesquisa sugere que ela poderia, na verdade, nos incentivar a melhorar nossas habilidades sociais centradas no ser humano.

Trabalhadores e empresas precisam ter a intenção de cultivar essas habilidades, que geralmente são mais difíceis de dominar, mais difíceis de medir e, frequentemente, são deixadas de lado em favor de habilidades técnicas.

Crédito: Elena Merkulova/ iStock

No entanto, se isso for feito com cuidado, um foco renovado nas habilidades interpessoais pode resultar em ambientes muito melhores, com muita conexão humana, valores fortes, comunicação rica e inovação dinâmica. 

A IA está nos desafiando a enfrentar muitas questões complexas no local de trabalho – e as possibilidades de sucesso e novas oportunidades são infinitas se lidarmos com isso com cuidado.

Cabe a nós decidir se permitiremos que a IA aprimore ou diminua as habilidades e conexões excepcionalmente valiosas e que, afinal,  nos tornam humanos.


SOBRE O AUTOR

Peter Cardon é professor na USC Marshall School of Business, onde pesquisa sobre comunicação intercultural e o papel da tecnologia na ... saiba mais