Mulheres e poder: o papel delas na frente à crise do clima
Coluna em colaboração com Mariana Ribeiro*

Como solucionar a sobreposição de crises – climática, econômica, social e geopolítica – do contexto atual? Um diagnóstico está claro: os paradigmas de poder que criaram esse cenário não vão ser capazes de solucioná-lo.
Na Itália, ao participar de um encontro com mulheres de várias partes do mundo, promovido pela organização global Project Dandelion, fomos presenteadas com um insight profundo para responder essa pergunta: muitas vezes, espaços de poder obrigam as mulheres a mudar sua natureza. Mas são as mulheres que deveriam ter espaço para transformar a natureza do poder.
As mulheres, de forma interseccional, estão revolucionando o poder, redefinindo o que ele significa, como é exercido e o que se produz a partir dele.
Estamos na linha de frente, inovando, empreendendo e provando que a geração compartilhada de policapital – um conceito que reúne conhecimento, riqueza e diálogos para minimizar o impacto socioambiental – é um excelente caminho para enfrentar desafios mais urgentes do nosso tempo.
Mary Robinson, uma das fundadoras do Project Dandelion, é um exemplo vivo disso. Foi a primeira mulher eleita presidente da Irlanda em 1990. Ocupou o cargo de alto comissariado da ONU para os direitos humanos por cinco anos anos. Viajou o mundo em missões diplomáticas e atuou em resposta a crises humanitárias.
Foi dela que partiu o convite para a imersão com outras 20 mulheres, em Bellagio, às margens do lago Como, na Itália.
Lá, ouvimos Mrs Robinson defender que a liderança feminina não deve ser contraposta à masculina, mas reconhecida em sua diferença. Segundo ela, as mulheres desenvolveram um estilo menos hierárquico, mais prático, focado na escuta e na resolução de problemas – uma abordagem inclusiva, que reconhece desigualdades e exerce empatia. "Precisamos desse tipo de liderança. Precisamos de equilíbrio", disse.
Na pauta de clima, a participação feminina não é apenas uma questão de “como”, mas também uma questão de “o quê”. Estudos mostram que políticas ambientais lideradas por mulheres tendem a ser mais integradas e sustentáveis.

Além disso, mulheres são as mais afetadas pela crise climática, o que reforça a necessidade de sua presença ativa nos espaços de decisão. Mesmo diante disso, ainda estamos historicamente sub-representadas em delegações e fóruns de tomada de decisão como as COPs (Conferências das Nações Unidas sobre Mudança do Clima).
Da agricultura regenerativa à resiliência hídrica, das novas economias à conservação comunitária, as mulheres estão criando estratégias e inovações que respondem às realidades urgentes de um planeta em transformação.
Suas abordagens podem ser profundamente enraizadas no conhecimento local, mas têm também o potencial de ser ampliadas e replicadas em regiões que enfrentam desafios socioeconômicos e ambientais semelhantes. No entanto, apenas 0,2% de todo o financiamento filantrópico é destinado especificamente às mulheres e ao meio ambiente.
as mulheres desenvolveram um estilo menos hierárquico, mais prático, focado na escuta e na resolução de problemas.
Neste contexto, a COP30, que acontecerá no Brasil este ano, ganha um significado ainda mais relevante. A Amazônia, palco do evento, é um território central para a agenda climática global, e demanda com urgência ações concretas de preservação dos recursos naturais.
Histórica e estatisticamente, a participação ativa das mulheres nesse espaço será, mais uma vez, essencial para garantir que a perspectiva de justiça climática esteja no centro das discussões.
Ao ocupar esses espaços e redefinir os paradigmas de poder, não apenas responderemos aos desafios do presente, mas também construiremos um novo imaginário de liderança – um que coloque a justiça climática, a inovação social e a colaboração no centro das soluções globais.
- Mariana Ribeiro é cofundadora e CEO do CLARICE, estúdio de inteligência e imaginação sobre mulheres e poder. Atua há mais de 10 anos em projetos e campanhas de impacto em diversas causas. É conselheira do Instituto Update, do Centro Brasileiro de Justiça Climática, do Instituto MOL, da All Out, e do Centro de Mídia e Democracia da FGV.