Como a Finlândia eliminou o carvão da sua matriz energética em apenas 2 anos
Em 2022, 64% da energia para aquecimento de Helsinque vinha do carvão. Após fechar a última usina de carvão, essa porcentagem caiu para zero

Alguns anos atrás, se você ligasse o aquecimento em qualquer apartamento da cidade de Helsinque, a energia provavelmente viria do carvão. Mas a empresa de energia da cidade fechou uma planta de carvão em 2023, e a última delas encerrou suas atividades na semana passada – quatro anos antes da meta estabelecida pelo governo da Finlândia.
“Em dois anos, conseguimos eliminar completamente o carvão”, comemora Olli Sirkka, CEO da Helen, a empresa de energia, que é uma subsidiária da municipalidade.
A cidade tem um dos maiores sistemas de aquecimento público do mundo, com uma rede de tubulações subterrâneas cheias de água quente que fornecem calor para os edifícios. É necessária uma enorme quantidade de energia para fazer esse sistema funcionar. Agora, grande parte dessa energia vem de fontes eólicas, que mais que dobraram na Finlândia desde 2020.
Helsinque, a capital, está construindo a maior bomba de calor do mundo, que vai fornecer aquecimento para 30 mil domicílios quando começar a funcionar, em 2026. No local de uma das usinas de carvão fechadas, a cidade está construindo uma nova instalação que vai captar calor do Mar Báltico.
Agora, parte da energia também vem de pellets de madeira, que Helsinque está usando temporariamente enquanto faz a transição completa para abandonar a queima de combustíveis fósseis.
A madeira ajudou a substituir o gás natural da Rússia depois da invasão da Ucrânia, mas não é uma solução de longo prazo. Afinal, queimá-la ainda produz CO2, ameaça as florestas e é uma alternativa mais cara do que outras. A Finlândia planeja eliminá-la completamente até 2040.
Helsinque também usa um pouco de energia hidrelétrica e nuclear, além de aproveitar o máximo de calor residual possível. Isso inclui captar calor de centros de dados locais e do esgoto.
COMO A FINLÂNDIA ELIMINOU O CARVÃO
Embora as usinas de carvão tenham sido fechadas rapidamente, a pressão começou há mais de uma década. Em 2015, uma campanha chamada "Coal Free Helsinki" (Helsinque Livre de Carvão) convenceu o conselho da cidade a se comprometer a fechar a primeira usina.
“Acho que os ativistas tiveram um papel muito importante”, analisa Amanda Pasanen, que estudou a eliminação do carvão e agora é membro do conselho da cidade. “Foi muito devido à pressão pública que decidiram abandonar o carvão.”
Naquela época, ainda não estava claro como isso poderia acontecer. “Esse objetivo era considerado completamente impossível”, relembra Sirkka. “Talvez tenha sido somente há quatro anos que houve uma decisão firme de que isso tinha que acontecer. E aí começou a fluir muito rápido.”

A queda acentuada no custo da energia eólica, graças a avanços tecnológicos e produção em maior escala, foi fundamental. “A energia eólica diminuiu tanto o preço da eletricidade que, na verdade, é uma ótima jogada de negócios substituir o carvão por eletricidade”, diz ele.
No dia em que conversamos, estava ventando o suficiente para que os preços da eletricidade na Finlândia caíssem a zero.
A Finlândia é um lugar com muito vento e bem adequado para essa tecnologia. Embora também tenha um pouco de energia solar, o país está tão ao norte que não há sol no inverno e a energia solar não pode ser usada para aquecer. A empresa de energia monitora de forma contínua as fontes de energia, trocando de uma para outra para otimizar os custos.
Helsinque está construindo a maior bomba de calor do mundo, que vai fornecer aquecimento para 30 mil lares.
Outros fatores também pressionaram a empresa a agir rapidamente. O sistema de comércio de emissões da União Europeia aumentou o preço do carvão à medida que os preços do carbono subiam ao longo do tempo.
Em 2019, a Finlândia aprovou uma lei para eliminar o carvão até 2029 como parte de seu plano climático. Mudanças na política fiscal tornaram o carvão mais caro e a energia limpa mais barata. Em 2021, Helsinque decidiu acelerar seu próprio projeto para se tornar neutra em carbono, mudando a data limite de 2035 para 2030.
“Há um amplo consenso político sobre a questão [da ação climática]”, diz o prefeito de Helsinque, Juhana Vartiainen. Quando ele assumiu o cargo, em 2021, havia um acordo quase unânime de que a cidade deveria acelerar seus planos (já ambiciosos) para cortar emissões.
No entanto, mesmo com esse mandato político, não estava garantido que a mudança aconteceria tão rapidamente quanto aconteceu. “Tem sido surpreendente ver como essa mudança para a eletricidade aconteceu tão depressa”, diz Vartiainen.