Tropeços do governador da Flórida guardam boas lições para CEOs e marcas

A mais importante delas é que é melhor pensar duas vezes antes de abandonar os compromissos com a sustentabilidade e a inclusão

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Nick Merrill e Dan Schwerin 5 minutos de leitura

O governador da Flórida, Ron DeSantis, está perdendo sua guerra contra o chamado "capitalismo consciente". Novos dados revelam o quanto ele avaliou mal a questão central da campanha e ajudam a explicar por que sua candidatura está afundando.

Para os CEOs cautelosos com as reações da direita, agora é a hora de aprender com esses erros e pensar duas vezes antes de abandonar os compromissos com a sustentabilidade e a inclusão.

DeSantis costuma se gabar por ter punido a Walt Disney Co. quando a empresa se manifestou contra o projeto de lei conhecido por "Don't Say Gay" na Flórida, que proíbe a discussão sobre orientação sexual ou identidade de gênero nas salas de aula.

Também retirou o financiamento à nova sede do Tampa Bay Rays depois que o time de beisebol tuitou sobre a prevenção da violência armada, em seguida ao massacre na escola de Uvalde, Texas. O governador ainda ameaçou processar a marca de cerveja Anheuser-Busch por causa de sua parceria publicitária com Dylan Mulvaney, uma estrela transgênero do TikTok.

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Essas não foram as primeiras iniciativas do gênero nos EUA. Diversos estados liderados por republicanos têm agido no sentido de penalizar bancos e gestores de ativos que incluem o impacto da mudança climática em seus cálculos de investimento. Há também uma onda de ações judiciais contra programas corporativos de diversidade e inclusão.

Esse conjunto de ações teve um efeito intimidador nos altos escalões corporativos de empresas de todo o país. Há menos CEOs falando sobre esforços para tornar cadeias de suprimentos mais verdes ou diversificar a força de trabalho. Muitos estão com medo de se tornarem o próximo alvo de críticas da Fox News (emissora de TV que é uma espécie de porta-voz dos conservadores nos EUA) ou de serem convocados a depor em algum comitê do Congresso norte-americano.

Trabalhadores, clientes e investidores buscam empresas que compartilhem seus valores e não tenham medo de agir em nome deles.

Mas a "guerra cultural" da extrema-direita ("war on woke", como ficou conhecida em inglês) não está dando certo. E os resultados de uma nova pesquisa devem servir como um alerta para os CEOs mais apreensivos.

De acordo com um levantamento recente da empresa de relações públicas Weber Shandwick, a maioria dos consumidores espera que as empresas assumam posicionamentos públicos sobre mudanças climáticas, racismo e violência armada. Além disso, 65% dos funcionários acreditam que as empresas têm a responsabilidade de se manifestar sobre questões importantes da sociedade.

Sem dúvida, ainda há riscos quando as empresas se envolvem em controvérsias dentro de uma “guerra cultural”, como comprovam os casos da Disney e da Anheuser-Busch. Mas muitos líderes empresariais tiraram lições equivocadas dessas experiências.

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O ex-CEO da Disney, Bob Chapek, teve problemas na Flórida porque acreditou que poderia evitar se posicionar sobre uma questão que era extremamente importante para seus funcionários. Apenas ao se deparar com uma revolta interna, ele resolveu mudar de posição. Em vez de transmitir valores claros e consistentes, ele transmitiu fraqueza e inconsistência.

Não é de se admirar que um provocador como DeSantis tenha visto nessas polêmicas uma oportunidade de marcar pontos políticos. A Anheuser-Busch, criticada pelo marketing inclusivo que acolheu os consumidores LGBT+, também não conseguiu sustentar seus valores e cedeu à pressão rápido demais. Isso só abriu a retaguarda para mais ataques de todos os lados.

Já as empresas que são consistentes e autênticas em relação a seus próprios valores tendem a prosperar. Quando a Nike publicou um anúncio, em 2018, com o jogador de futebol americano e ativista dos direitos civis Colin Kaepernick, os conservadores enfurecidos pediram um boicote. Mas a Nike apoiou Kaepernick e seu protesto contra o racismo sistêmico. As vendas e o preço das ações da empresa dispararam.

Talvez não exista empresa mais ativista que a Patagonia. Seria de se esperar que ela fosse altamente polarizadora. Mas em vez disso, é a marca mais respeitada dos Estados Unidos, de acordo com a pesquisa Axios-Harris, recebendo elogios de liberais e conservadores por sua liderança forte.

Tendo trabalhado com empresas como a Nike e a Patagonia, percebemos que os líderes corporativos mais eficazes têm clareza sobre seus valores fundamentais. Eles criam estruturas que os ajudam a decidir quando e como se envolver em questões controversas e entendem que têm responsabilidades não apenas com os acionistas, mas também com funcionários, clientes, comunidades e, enfim, com o planeta.

Apesar da reação negativa, o argumento comercial para esse tipo de "capitalismo consciente" continua firme e forte. Trabalhadores, clientes e investidores estão buscando empresas que compartilhem seus valores e não tenham medo de agir em nome deles. 

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Líderes com visão de futuro entendem que, embora possa parecer mais seguro ficar em cima do muro e evitar se envolver em qualquer causa que possa ser vista como política, também é perigoso voltar atrás em compromissos públicos e decepcionar funcionários e outras partes interessadas. Em linhas gerais, um planeta mais saudável, uma sociedade mais justa e uma democracia mais forte são bons para qualquer negócio.

Talvez DeSantis esteja finalmente percebendo que perseguir empresas privadas por expressarem seus princípios e valores não é uma boa estratégia política. Recentemente, ele demitiu seu coordenador de campanha e chegou a erguer a bandeira branca em sua luta contra a Disney.

Os CEOs que ainda estão com medo de boicotes reacionários precisam se inspirar no nome do super PAC do próprio DeSantis: "Never Back Down" (nunca abaixe a cabeça).


SOBRE O AUTOR

Nick Merrill e Dan Schwerin são cofundadores do Evergreen Strategy Group. saiba mais