Como investir em previdência privada e ter uma aposentadoria tranquila
Com as regras da previdência pública dificultando cada vez mais o acesso ao benefício, cresce o interesse pelos planos
Os planos de previdência privada atingiram até novembro de 2024 a soma de R$ 176,5 bilhões, um aumento de 15,4% em comparação ao mesmo período de 2023, segundo dados do relatório da Federação Nacional da Previdência Privada (Fenaprevi). No país, mais de 11 milhões de pessoas têm algum tipo de previdência particular, individuais ou coletivos.
Entre as justificativas para a popularização desses fundos está o déficit da Previdência Social (o conhecido INSS), baseada em um modelo que “está se esgotando”, na visão de especialistas do setor. O problema tem a ver com a transição demográfica que o Brasil enfrenta, com queda da natalidade e aumento da expectativa de vida.
“Antes, o sistema se sustentava. Mas a relação demográfica começou a mudar e, hoje, o índice de natalidade está em torno de 1,5 mínimo por casal. Cada vez temos menos pessoas entram no mercado de trabalho para conseguir manter a contribuição para a massa de aposentados. E esses só estão aumentando”, explica Carlos Castro, coordenador da Comissão de Relacionamento com Associados da Planejar.
A partir da Reforma da Previdência, o governo brasileiro alterou em 2019 as regras da aposentadoria por tempo de contribuição. Neste ano, entrou em vigor mais uma fase das novas regras: a idade mínima exigida é de 59 anos para mulheres, com 30 anos de trabalho formal, e de 64 anos para homens, com 35 anos de contribuição.
O direito à aposentadoria por tempo de serviço será ajustado anualmente até 2031, quando mulheres precisarão ter 62 anos e os homens, 65, para conseguir o benefício.
Neste cenário, as possibilidades de previdência privada despontam como um recurso atrativo, funcionando como uma renda complementar à aposentadoria social. Mas vale o alerta: analistas indicam que o INSS não deve ser esquecido, ainda que seu valor possa ser pequeno se comparado a outros rendimentos.
A conta que justifica é simples: assumindo que o trabalhador tenha na aposentadoria social o benefício mensal de R$ 2.500 mil, isso significa na prática uma economia pessoal de cerca de R$ 600 mil em 20 anos, já que o montante não foi acumulado por capital próprio, ou seja, o beneficiário não teve de construir diretamente para chegar a esse patrimônio.
Já os planos de previdência privada funcionam ao mesmo tempo como um investimento de mercado e como uma espécie de seguro, no momento em que acontece o resgate do valor investido. Mas, pelo aspecto fiscal, os fundos de previdência são mais eficientes no longo prazo, isso porque é possível ter um retorno maior devido ao regime de tributação específico da previdência privada.
Outro ponto interessante é que neste tipo de investimento não há a incidência de come-cotas. A tributação recai somente quando o cliente recebe os benefícios, seja via resgate ou renda de aposentadoria.
Nos fundos tradicionais de mercado, o imposto de renda é cobrado em movimento por ano, o que diminui o valor do capital e, consequentemente, o valor do retorno final.
QUANDO E POR ONDE COMEÇAR A INVESTIR
Quanto mais cedo o contribuinte começar a aplicação no fundo privado, melhor, já que a data de início vai determinar o tempo total de alocação do investimento que é feito mensalmente - de certa forma, a lógica é a mesma da aposentadoria social, que faz a contagem pelo tempo de trabalho/contribuição.
Por isso, é necessário, também, planejar quanto se quer ganhar de renda no futuro. Assim, define-se o montante e o valor das contribuições mensais com base no prazo desejado para o início da aposentadoria.
“É possível fazer previdência até para recém-nascidos. O ideal é que se comece o quanto antes, pois assim o valor das contribuições mensais não precisa ser tão volumoso e o longo prazo será um aliado para a construção do patrimônio, devido à dinâmica dos juros compostos”, explica Leandro Labes dos Santos, gerente de Produtos Previdência na SulAmérica Vida e Previdência.
Mas a aposentadoria privada não deve ser descartada por aqueles que não começaram o investimento desde cedo, pois, para ter uma renda mensal a partir do fundo, é preciso investir por pelo menos 20 anos. Então, se o objetivo é se aposentar aos 65 anos, é possível começar aos 45 anos.
Carlos Castro, da Planejar, recomenda que o primeiro passo seja separar um valor, dentro das possibilidades do planejamento financeiro individual, para investir. Vale começar até com quantias pequenas, como R$ 100, mesmo que o montante final ainda não tenha sido definido.
“Depois, o investidor vai evoluindo a quantia ao longo do tempo, entendendo qual é o valor de contribuição de fato que ele vai ter de colocar para ter um benefício adequado lá na frente”, comenta Castro.
Um dos erros mais comuns de quem investe na previdência privada está na etapa de definição da contribuição. Segundo Labes dos Santos, dado o horizonte longo do investimento, é preciso “reavaliar o plano anualmente e fazer novos cálculos para ajustar os valores mensais e objetivos”.
A boa notícia é que a contribuição é ajustável na vigência do plano. Se o cliente quiser, é possível aumentar os valores mensais ou fazer aportes esporádicos para intensificar o rendimento do patrimônio.
QUAL PLANO DE PREVIDÊNCIA ESCOLHER?
Selecionar o tipo de produto previdenciário deve passar primeiro pela declaração do imposto de renda do contribuinte, já que há planos indicados para quem faz a declaração no modelo completo e no regime simplificado.
De acordo com Santos, antes de escolher é importante observar fatores como prazos de investimento, regime de tributação, rentabilidade e solidez da seguradora ou instituição financeira escolhida.
Os dois planos mais comercializados são o VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre) e o PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre). Geralmente, o primeiro é recomendado para contribuintes que fazem a declaração simplificada do Imposto de Renda, enquanto o segundo é indicado para contribuintes que fazem a declaração completa, já que, com ele, é possível diferir o valor de até 12% na base de publicação do imposto.
No entanto, para que essa “dedução” não seja ilusória, é necessário que a compensação do tributo seja aplicada. Isso porque o contribuinte paga essa diferença de imposto, que deixa de tributar agora, ao fazer o resgate do recurso total investido na previdência.
COMO É A TABELA DE TRIBUTAÇÃO DA PREVIDÊNCIA?
Uma das primeiras coisas que o beneficiário do plano privado deve fazer é decidir por qual tabela de imposto optar. Existe a regressiva, que pode contemplar aqueles que querem deixar o dinheiro investido por mais de 10 anos, já que ela é regressiva no tempo. Ou seja, ao deixar o investimento por pelo menos uma década, paga-se obrigatoriamente 10% de imposto no resgate.
Já a tabela progressiva é igual a do Imposto de Renda. Dependendo do montante do recurso investido, o beneficiário pode pagar de 7% até 27,5%.
“Em comparação ao mercado tradicional de investimento, que tem imposto de 15%, se o contribuinte aplicar o recurso por um tempo acima de 10 anos no fundo de previdência, a tabela regressiva funciona mais, porque ele terá economizado 5% no imposto. No lugar de pagar 15%, paga-se 10%”, analisa Castro, da Planejar.
Da mesma forma, a tabela progressiva da previdência privada também pode ser mais vantajosa que um fundo de multimercado.
“A depender do valor que você vai resgatar, é possível pagar 7,5% do IR e não necessariamente os 15%, que é o mínimo que você paga ao investir nos fundos de investimento. Então, a previdência privada tem essa eficiência fiscal muito grande”, completa Castro.
Em termos práticos para o contribuinte, a indicação de Santos é organizar o planejamento da previdência da seguinte forma:
● PGBL com tabela regressiva: para aqueles que fazem a declaração completa de IR e têm intenção de investir no longo prazo;
● PGBL com tabela progressiva: se a declaração de IR for realizada no modelo completo e a intenção for investir no curto prazo;
● VGBL com tabela regressiva: para o contribuinte que opta pela declaração de IR no modelo simplificado e tem a intenção de investir no longo prazo;
● VGBL com tabela progressiva: se a declaração de IR for simplificada e a intenção seja investir no curto prazo
Já para pessoas que queiram contribuir com mais do que 12% da sua renda bruta anual, o analista indica que também é possível contratar os dois planos: um PGBL para contribuir até o teto de 12% e um VGBL para o restante. “Assim o cliente maximiza os ganhos tributários possíveis”, completa Santos.
Vale lembrar que, desde o ano passado, com a nova resolução do governo, é possível decidir qual será a tabela tributária incidente - regressiva ou progressiva - somente no momento do retirada do valor total investido.
QUANDO FAZER O RESGATE DA APOSENTADORIA PRIVADA?
Quem opta pela aplicação nos fundos de previdência, pode escolher entre diversos tipos de renda. É possível fazer o resgate único do valor total, com o encerramento do plano, ou receber mensalmente parcelas do benefício, no modo vitalício.
Aqui é preciso manter a atenção, já que os especialistas apontam que, na retirada única, a má gestão do investimento pode levar a perda do montante.
E há, ainda, outro erro comum de quem investe em planos de previdência: definir de forma equivocada o prazo do resgate, ou mesmo sacar o montante antes do tempo final.
De acordo com Castro, da Planejar, para este tipo de aplicação fazer sentido no rendimento, é preciso que o tempo médio de investimento seja pelo menos entre sete e oito anos.
“Se o contribuinte resgatar antes disso, a previdência privada de fato não será eficiente, porque, por mais que ela entregue a mesma rentabilidade que o mercado tradicional, o benefício da aplicação está no fiscal. Então, se retirar antes, esse benefício vira uma punição”, explica Castro.