Sangue novo na IA generativa: aplicações na transformação de negócios

A nova versão do ChatGPT que "raciocina" deve ser analisada a partir das suas consequências diretas e indiretas no ambiente de negócios

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Herman Bessler 9 minutos de leitura

O o1-preview (codinome Strawberry), lançado oficialmente no dia 12 deste mês, é o mais recente modelo da OpenAI focado em aprimorar a capacidade de "raciocínio" lógico e multietapas do Chat GPT. O modelo tem a capacidade de balancear estratégias de análise e argumentos, o que gera respostas mais complexas.

Ele está se aproximando do raciocínio em nível humano em algumas áreas, causando divergência sobre níveis equivalentes a humanos em graduação ou PhD, dependendo do ramo de conhecimento.

Ao contrário de seus antecessores, o o1 tem uma abordagem mais lenta e ponderada, resultado da implementação da técnica chamada chain of thought (cadeia de pensamento, ou CoT, na sigla em inglês).

Essa técnica permite que o modelo decomponha os problemas em etapas menores, melhorando a precisão em tarefas que requerem raciocínio complexo. Isso o distingue de modelos anteriores, como o GPT-4o, que tendia a "prever" a próxima palavra sem um entendimento profundo de contexto e lógica​.

As melhorias em benchmarks demonstram o poder do o1. Ele se destacou em competições como a Olimpíada Internacional de Matemática, onde resolveu 83% dos problemas contra apenas 13% do GPT-4o.

Além disso, o modelo se mostrou altamente eficaz em tarefas de programação, alcançando o 89º percentil em competições como Codeforces, muito acima do desempenho de seus antecessores – ultrapassando o Claude, seu principal concorrente no uso para desenvolvimento de código​.

O destaque do novo modelo, contudo, está na ampla gama de casos de uso empresariais que se tornam viáveis em escala a partir destas novas capacidades.

Tenho sido testemunha ocular de transformações em dezenas de corporações brasileiras nos últimos anos e registrado o sucesso (e o fracasso) da implementação de ferramentas e casos de uso diversos de IA. Após estudo do paper e experimentação do o-1 preview, proponho uma análise crítica preliminar sobre a aplicação do modelo nas organizações. 

A PROFUNDIDADE DO RACIOCÍNIO MULTIDIMENSIONAL

Tradicionalmente, a inteligência artificial no mundo corporativo focou em automatizar tarefas repetitivas e otimizar processos existentes pontuais. Ao incorporar raciocínio em múltiplas etapas e dimensões, o modelo considera variáveis interconectadas e oferece soluções que antes exigiam equipes multidisciplinares de especialistas.

Estou bastante ansioso para ver como esse novo "motor" se combinará com os GPT Agents já disponíveis para os modelos anteriores, a fim de construir equipes de agentes especializados e produzir automações complexas de processos organizacionais completos. 

Crédito: Reprodução/ YouTube

O potencial dessa evolução deve impactar diretamente a forma como as empresas abordam a estratégia, a análise e os portfólios de inovação. Em vez de depender exclusivamente de dados históricos e intuição humana, líderes podem explorar análises profundas que consideram uma miríade de fatores em tempo real, desde tendências de mercado até mudanças geopolíticas. E podem fazê-lo em um processo colaborativo como a I.A. 

Ao combinar análises financeiras, considerações socioeconômicas e tendências tecnológicas, o o1-preview permite que líderes empresariais vejam o "quadro completo". Essa integração multidisciplinar é crucial em um mundo onde as fronteiras entre indústrias estão cada vez mais tênues.

DESEMPENHO IMPREVISÍVEL E LIMITAÇÕES INTRÍNSECAS

Apesar de suas capacidades impressionantes, o desempenho do o1-preview não é uniforme. Ainda é desafiador prever em quais domínios o modelo terá excelência. Em tarefas subjetivas que exigem nuances, como escrita criativa ou edição de texto, seu desempenho é menos consistente quando comparado a modelos anteriores, como o GPT-4.

Mesmo seguindo uma sequência  de passos de raciocínio, as melhorias do modelo baseiam-se na capacidade de recuperar bons padrões de raciocínio dos dados de treinamento, em vez de raciocinar a partir de princípios fundamentais, o que limita sua capacidade de produzir soluções em tarefas que carecem de curadoria e criatividade. 

Considere como exemplo uma agência de marketing que busca criar campanhas publicitárias inovadoras. Ela pode encontrar limitações ao usar o o1-preview para gerar conteúdo criativo com consistência de marca.

As capacidades avançadas do o1-preview abrem caminho para a reimaginação completa de modelos de negócio tradicionais.

Nesses casos, a intervenção humana continua sendo essencial para refinar e validar as ideias propostas pela IA. Particularmente, prefiro o modelo 4o para estes casos utilizando AI Agents especializados para a tarefa.

O modelo é mais lento em comparação a versões anteriores, devido à profundidade de processamento necessária para resolver problemas complexos. Esse tempo de resposta pode ser uma barreira em situações que exigem agilidade, como atendimento ao cliente em tempo real ou respostas rápidas em processos operacionais.

No entanto, essa latência é compensada em setores onde a precisão é mais crítica do que a velocidade, como na gestão de portfólios de inovação ou no desenvolvimento de novos produtos e serviços. Ainda não se sabe quais são as limitações deste método de aprimoramento contínuo baseado em dados de treinamento; estamos na fronteira desta jornada, neste momento.

Chovendo no molhado, a confiança em IA também depende da construção de uma governança robusta, que assegure o uso ético e responsável da tecnologia. A IA generativa, se não gerida corretamente, corre alto risco de gerar resultados inesperados e enviesados, o que demanda diretrizes claras e medidas de segurança para mitigar esses riscos e maximizar os benefícios.

DRIVERS DE VALOR E AVENIDAS DE CRESCIMENTO EMERGENTES

Análise multidimensional

O o1-preview desbloqueia novos drivers de valor que podem ser explorados de forma estratégica. A análise multidimensional de dados permite que as empresas identifiquem padrões e correlações antes imperceptíveis.

Um varejista, por exemplo, pode utilizar o modelo para analisar o comportamento do consumidor, tendências sociais e dados econômicos, otimizando o estoque e as estratégias de precificação em tempo real. Isso resulta, é claro, em maior eficiência operacional e vantagem competitiva.

Expansão multilíngue

A expansão global torna-se mais acessível. Com melhorias significativas em idiomas além do inglês, o modelo permite que empresas atuem em mercados internacionais com maior eficácia.

Uma startup de tecnologia pode lançar produtos simultaneamente em diversos países, adaptando suas estratégias de entrada com base em análises específicas de cada região. Isso aumenta as chances de sucesso e acelera o crescimento global.

Inovação em produtos e serviços

Ao simular cenários complexos, as empresas podem desenvolver soluções personalizadas. No setor de saúde, por exemplo, é possível criar planos de tratamento individualizados que consideram histórico médico, estilo de vida e predisposições genéticas.

Novas oportunidades de negócio estão emergindo em diversos setores. Áreas como finanças, logística e saúde podem explorar o o1-preview para desenvolver serviços inovadores.

Por exemplo, instituições financeiras podem oferecer consultoria personalizada baseada em análises profundas de mercado que consideram múltiplas variáveis econômicas e geopolíticas. Isso permite uma oferta mais alinhada às necessidades específicas de cada cliente, aumentando a satisfação e, por consequência, a fidelização e o lifetime value.

Aquisição de clientes

A aplicação na aquisição de clientes é visível tanto no topo do funil de marketing – auxiliando em estratégias de planejamento de comunicação e segmentação de audiência – até o fundo do funil comercial, onde a ferramenta pode ser utilizada para construir propostas comerciais, aconselhar negociações e estruturar estratégias de relacionamento.

REDEFINIÇÃO DOS MODELOS DE NEGÓCIO

As capacidades avançadas do o1-preview abrem caminho para a reimaginação completa de modelos de negócio tradicionais, acelerando a transição para modelos mais digitais e escaláveis.

Empresas podem explorar novas avenidas de crescimento ao alavancar a IA para desenvolver produtos e serviços que antes eram impraticáveis ou inimagináveis. A servitização e os modelos baseados em IA estão ganhando destaque. 

Indústrias tradicionalmente focadas em produtos podem transitar para modelos de serviços, oferecendo soluções personalizadas em tempo real.

Imagine fabricantes de equipamentos industriais utilizando o o1-preview para monitorar e prever necessidades de manutenção, oferecendo contratos de performance em vez de simples vendas de equipamentos. O caso de uso não é imediato, pois dependerá de um framework de agentes IA integrado ao modelo, mas é uma questão de semanas ou meses. 

Cabe destacar ainda o potencial para a desintermediação e a entrada de novos competidores. Com a IA capacitando análises e operações complexas, as barreiras de entrada em mercados altamente regulados ou tecnicamente desafiadores podem ser reduzidas.

Isso possibilita o surgimento de novos competidores que utilizam modelos de negócio disruptivos, pressionando empresas estabelecidas a inovarem rapidamente para manter sua relevância no mercado.

VEREDITO

Vale a pena utilizar o o-1 preview em escala dentro das organizações, mesmo com suas limitações. Escolher o melhor modelo para a tarefa a ser feita segue sendo papel humano. O Gemini vai performar melhor em grandes janelas de contexto, o 4o em tarefas criativas, o Grok em soluções que carecem de velocidade e baixo custo…

O principal ponto de atenção segue sendo a integração da IA generativa nas operações empresariais. Conforme destacado pelo Digital Data Design Institute de Harvard, um dos maiores desafios das empresas está na operacionalização da IA generativa, em especial na disseminação da adoção eficiente e responsável dentro dos sistemas organizacionais.

Ainda não se sabe quais são as limitações deste método de aprimoramento contínuo baseado em dados de treinamento.

Isso requer investimento em infraestrutura, formação de equipes e, acima de tudo, uma liderança que compreenda os potenciais limites e as capacidades da tecnologia​.

O modelo ainda tem potencial para crescer em escala e capacidade, com dois eixos principais de expansão: modelos-base maiores e mais poder computacional de inferência.

É uma ferramenta poderosa, mas que deve ser usada com consciência de suas limitações atuais. Estou ansioso para ver como o GPT o1 continuará a evoluir e influenciar os futuros do trabalho com IA generativa.

DICAS PRÁTICAS PARA MAXIMIZAR O USO DO o1-PREVIEW

Para explorar todo o potencial do OpenAI o1-preview, os líderes precisam ajustar suas abordagens de interação com o modelo. Aqui estão algumas diretrizes baseadas nas dicas divulgadas pela OpenAI e na minha experiência com o modelo:

  1. Organização com delimitadores: use símbolos como "###" para estruturar o conteúdo, facilitando a interpretação pelo modelo.
  2. Evite detalhar o chain of thought: o o1-preview já faz raciocínios em múltiplas etapas internamente. Instruções explícitas sobre como o modelo deve pensar podem prejudicar a performance.
  3. Contexto relevante: limite o contexto a informações essenciais para a tarefa. O excesso de dados pode gerar respostas confusas ou demorar mais do que o necessário.
  4. Foque em tarefas objetivas e analíticas: para aproveitar ao máximo o GPT o1, concentre-se em tarefas com respostas claras e binárias, onde o modelo demonstra maior precisão.
  5. Valide respostas subjetivas: em áreas que envolvem julgamento humano ou criatividade, é importante revisar e validar as respostas fornecidas pelo modelo.
  6. Explore recursos multilíngues: aproveite as melhorias em outros idiomas para aplicações internacionais ou em contextos multilíngues.

SOBRE O(A) AUTOR(A)

Herman Bessler é fundador e CEO do Templo.cc. saiba mais