Você precisa desaparecer para conseguir existir?
A estética do anonimato e da ausência nas redes sociais é um desejo legítimo ou um novo símbolo de status?

Começo esta coluna com uma declaração pessoal: apesar de trabalhar com comunicação digital, sou adepto do feed zero. Estou no Instagram porque muita gente começou a achar que poderia haver algo de errado por eu não marcar presença na rede – uma atitude meio sexy, meio freak.
Encontrei um meio-termo saudável: mantenho meu feed zerado, mas permito que amigos me marquem em fotos sociais e, eventualmente, subo imagens e vídeos nos stories.
E você, como se relaciona com as redes? Qual é o seu objetivo? O que você compartilha e por quê?
Tenho acompanhado com curiosidade – e uma dose de desconfiança – um movimento contrário à superexposição, principalmente entre jovens da geração Z.
Nascida entre meados dos anos 1990 e 2010, essa geração cresceu imersa na internet, mas tem adotado um comportamento diferente no mundo digital. O que não significa que esteja menos conectada.
Amigas com filhos entre 15 e 25 anos confirmam: “eles entram o tempo inteiro. Só não postam”, disse uma delas. Ou postam em perfis secundários, quase secretos, como o ‘dix’ – contas privadas onde compartilham conteúdos mais espontâneos, longe dos olhares do público geral.
No perfil aberto, tudo é calculado, inclusive a ausência. No fechado, expressam o que interpretam como a vida real: uma imperfeição planejada.
Mais do que um suposto desejo por privacidade, esse comportamento me intriga: em vez de representar um afastamento genuíno do digital, vejo como uma nova forma de chamar a atenção.
Na economia da escassez, o que é raro se torna valioso. Quem não se expõe desperta curiosidade. E a ausência digital vira símbolo de status – um mistério atraente.

Em um mundo onde todos se mostram, não estar presente pode ser a nova forma de existir. O desejo nasce da falta, dizia Lacan, o psicanalista francês que reformulou a teoria freudiana.
No SXSW deste ano, um dos maiores termômetros de tendências de cultura, comportamento e comunicação que acontece em Austin, Texas, a autenticidade na era da hiperconexão foi um dos temas debatidos.
Baratunde Thurston, pesquisador e apresentador do podcast Life with Machines, resumiu essa mudança ao afirmar: “o Instagram não vai ser mais social. Eles tiveram a oportunidade de se tornar a rede mais conectada para as pessoas e não fizeram isso. Estamos entrando na era das slow social media.”
Esta geração tem adotado um comportamento diferente no mundo digital. O que não significa que esteja menos conectada.
As redes sociais estão deixando de ser apenas ferramentas de visibilidade para se tornarem espaços de controle narrativo. Definir como e quando aparecer virou um jogo de poder digital. Não estar presente é, veja só, uma forma de marcar presença.
Esse paradoxo me leva a uma reflexão maior: será que estar off-line é realmente sobre liberdade ou apenas uma nova performance? O que antes era ostentação virou sobrecarga. O que era sobrecarga virou desejo. E assim seguimos, tentando equilibrar a necessidade de conexão com o fascínio pelo desaparecimento.
Talvez o verdadeiro luxo hoje seja justamente esse: escolher como queremos ser percebidos – mesmo que isso signifique, estrategicamente, não aparecer.