O que aprendeu a investidora que leu 597 currículos para contratar um gestor
Os bastidores de um processo seletivo à moda antiga

Recentemente, publiquei no blog da minha empresa de capital de risco, a Graham & Walker, um anúncio para uma vaga de chefe de gabinete. E, para minha surpresa, atraiu mais candidatos do que eu imaginava. Em menos de uma hora, mais de cem pessoas já tinham preenchido o formulário do Google – nossa única forma de inscrição.
Fiquei impressionada com a quantidade e logo comecei a perguntar para todo mundo que conheço como eu poderia fazer essa triagem de forma rápida e eficiente. Recebi sugestões de todos os tipos – desde ferramentas de IA até sistemas personalizados. Mas, no meio disso tudo, algo me fez repensar minha abordagem.
No formulário havia uma pergunta opcional: “tem mais alguma coisa que gostaria de compartilhar?”. E uma candidata escreveu: “candidatar-se a vagas é um processo tão desumanizante.”
Na hora, tomei uma decisão: se as pessoas estavam dedicando seu tempo e energia para se inscrever na vaga, eu também deveria fazer minha parte. Decidi ler todas as respostas. Como não costumo fazer contratações, pensei: por que não fazer isso do jeito certo, com calma, sem pular etapas?
Foi assim que acabei lendo 597 formulários, um por um, durante uma semana inteira. Sem IA, sem buscar palavras-chave, sem ler por alto. Li tudo de verdade.
Sei que isso não é o comum. A maioria dos sócios de fundos e recrutadores não faz isso – e, na maior parte das vezes, nem conseguiria. Talvez eu mesma nunca mais consiga repetir esse processo. Mas, para mim, valeu cada segundo. Foi uma experiência inesquecível.
UM PROCESSO TOTALMENTE MANUAL
Só para esclarecer: não li 597 currículos. Li as respostas de 597 pessoas para quatro perguntas simples:
1. Por que você decidiu trabalhar com capital de risco?
2. Por que quer trabalhar na Graham & Walker?
3. O que faz de você a pessoa certa para esse cargo?
4. Tem mais alguma coisa que gostaria de compartilhar?
Li o mais rápido que consegui, mas sempre parando quando algo me chamava a atenção. E, com base nas respostas, eu decidia se valia a pena olhar o currículo.
Dos 597 formulários, abri 174 currículos. Duas colegas minhas também leram cerca de 200 inscrições cada. Atribuímos notas aos perfis, selecionamos os melhores e chegamos a uma lista de 15 finalistas.
Esses candidatos participaram de uma primeira entrevista. Sete seguiram para a segunda etapa. Três chegaram à terceira e última. Nessa altura, eu já me imaginava trabalhando com qualquer um deles. Todos eram excelentes – e foi difícil ter que escolher um só.
No fim, contratamos uma candidata incrível – e ela topou o desafio.
O QUE OS CANDIDATOS PRECISAM SABER
Vamos ser realistas: esse tipo de procedimento não é sustentável, muito menos escalável. A maioria dos recrutadores não vai parar para fazer o que eu fiz – ainda mais agora, com ferramentas de IA cada vez mais acessíveis. Quem está buscando emprego precisa ter isso em mente.
Mas, se eu puder dar um conselho, é este: entenda quem vai avaliar você. Assim como orientamos os fundadores de startups a pesquisar sobre os investidores antes de fazer um pitch, quem busca uma vaga também deveria pesquisar sobre a empresa antes de se candidatar.

Se for uma empresa grande, com milhares de funcionários, o ideal é usar as palavras-chave certas no currículo. Mas, em empresas menores, o currículo por si só não vai dar conta de transmitir toda a sua jornada profissional.
Algumas das melhores respostas que li vieram de pessoas com perfis não convencionais. Outras tinham tanto um currículo brilhante quanto textos inspiradores. Existe uma diferença enorme entre quem quer “um” emprego e quem quer “esse” emprego.
Talvez isso não pese tanto no caso de contratações em massa. Mas, para uma vaga estratégica, de confiança, com impacto direto no nosso fundo, isso faz toda a diferença.
Um detalhe curioso: centenas de pessoas disseram ter uma “combinação única de estratégia e execução”. Li isso tantas vezes que perdi a conta. Talvez não seja tão única assim, afinal.
O QUE OS RECRUTADORES NÃO PODEM ESQUECER
A inteligência artificial está transformando a maneira como a gente trabalha, investe e constrói empresas. Mas ainda existem decisões que precisam de um olhar humano – e contratar alguém é, sem dúvida, uma delas.
Por trás de cada formulário tem uma pessoa real, com uma história única. Se quisermos construir empresas verdadeiras, não podemos perder isso de vista.
Só pude contratar uma pessoa desta vez. Mas ler os 597 formulários me fez lembrar de algo fundamental: o talento está por toda parte.
Essa experiência me forçou a parar e prestar atenção. Perceber a diferença entre alguém que apenas parece bom e aqueles que estão realmente comprometidos. E entender que entusiasmo, esforço, autenticidade e resiliência, muitas vezes, valem mais do que um currículo impecável.