Catastrofismo climático é perigoso, mas otimismo é pior ainda
A esperança é fundamental para promover mudanças, enquanto o otimismo cego pode nos impedir de agir
Quando falamos sobre mudanças climáticas, especialmente no âmbito de políticas públicas, o tema muitas vezes parece dividir as pessoas em dois grupos opostos: ambientalistas e negacionistas. Porém, aqueles que reconhecem os riscos reais da crise climática não formam um grupo homogêneo.
Mesmo entre os chamados “realistas climáticos”, existem várias perspectivas diferentes e, naturalmente, as discussões podem se tornar acaloradas. Ultimamente, tenho notado uma divisão clara entre otimistas e pessimistas.
A maioria dos especialistas defende que manter o otimismo é mais eficaz na luta contra as mudanças climáticas. O principal argumento para isso faz sentido: se acreditarmos que está tudo perdido, acabaremos nos rendendo a esse futuro trágico. Mas tenho que admitir que não são os pessimistas climáticos que me preocupam, mas sim os otimistas.
É claro que eu adoraria acreditar que tudo dará certo no final. No entanto, muitas vezes percebo que as pessoas estão tão confortáveis com essa crença que continuam a viver suas vidas sem questionar e sem considerar algumas das possibilidades mais sombrias que o futuro pode trazer.
Se queremos incentivar que mais gente faça ao menos pequenas mudanças em seu estilo de vida, como viajar menos de avião ou diminuir o consumo de carne – para não mencionar votar em candidatos que se preocupam com o clima –, precisamos fazer com que entendam que os riscos são reais. Tanto em nível diário e individual quanto em níveis mais amplos. O pensamento simplista de “ah, não importa, vai dar tudo certo” é o tipo de mentalidade que inibe a ação.
Se as pessoas compreendessem a urgência da situação, acredito que poderíamos ver uma grande mudança de tendência em um aspecto específico: a população. A decisão de ter ou não filhos é, obviamente, importante e envolve inúmeros fatores – e um deles é o meio ambiente.
reconhecer nossas pequenas e preciosas vitórias é importante, mas precisamos mantê-las em perspectiva e não depositar muita esperança em ideias improváveis.
As mudanças climáticas, sua progressão e nossas chances de detê-las são temas que deveriam influenciar o crescimento populacional tanto em nível individual (esta criança terá uma qualidade de vida adequada?) quanto em nível macro (apenas os mais ricos estarão a salvo das consequências de um planeta em aquecimento?).
Os otimistas tendem a rejeitar o pensamento “malthusiano”, que se baseia na ideia de que recursos finitos não podem sustentar uma população em crescimento exponencial para sempre. Embora seja tentador acreditar que uma população maior resultaria em mais inovações e mais oportunidades para enfrentar os efeitos das mudanças climáticas, essa visão simplesmente não encontra respaldo nas evidências.
O rápido crescimento da população ao longo das últimas décadas está relacionado a uma redução de 69% da vida selvagem e à alteração de pelo menos 70% – possivelmente até 97% – das terras do planeta.
Se a história nos ensina algo, é que o crescimento populacional sempre esteve associado a mais destruição, mesmo com o desenvolvimento de tecnologias avançadas. E não há muitos motivos para acreditar que isso mudará no futuro.
Infelizmente, alguns preferem ignorar a realidade. Os “otimistas patológicos”, por exemplo, como Elon Musk, parecem estar mais interessados em levar os seres humanos para outros planetas, antes mesmo de descobrirmos como não destruir o nosso próprio.
Essa ideia é bizarra por várias razões, principalmente porque considera a colonização espacial uma parte inevitável do nosso futuro próximo. Para eles, não é um problema os recursos da Terra serem limitados, porque, em breve, estaremos vivendo em outros planetas.
Mesmo que eu aceitasse essa premissa, essa mentalidade me assusta. Ainda não conseguimos sustentar a população atual no planeta em que vivemos sem causar danos irreparáveis ao meio ambiente e às outras formas de vida com as quais o compartilhamos. Espalhar a população humana pelo universo apenas recriará esses mesmos problemas, só que em uma escala cósmica.
Se queremos incentivar que mais gente faça ao menos pequenas mudanças em seu estilo de vida, precisamos fazer com que entendam que os riscos são reais.
Para ser justo, de tempos em tempos, surgem notícias promissoras – descobrimos que determinadas intervenções ambientais realmente tiveram um efeito positivo, ou ouvimos falar de tecnologias em desenvolvimento que podem oferecer soluções que antes não considerávamos possíveis.
Concordo plenamente que reconhecer nossas pequenas e preciosas vitórias é importante, mas precisamos mantê-las em perspectiva e não depositar muita esperança em ideias improváveis.
O ex-vice-presidente dos EUA, Al Gore, ressaltou os riscos do otimismo infundado em uma recente palestra sobre possíveis soluções climáticas conhecidas, como remoção de dióxido de carbono (RDC) e captura direta do ar (CDA), que visam remover os gases de efeito estufa da atmosfera. Embora seja uma ideia tentadora, essas tecnologias ainda são inviáveis – não funcionam tão bem quanto precisamos e são extremamente caras.
Mas a consequência mais preocupante do entusiasmo em relação à RDC e à CDA é que as empresas de petróleo parecem estar usando essas tecnologias como desculpa para continuar poluindo o ar. Gore cita como exemplo um CEO do setor que se referiu a elas como uma “licença” para que a indústria continue operando como sempre, indefinidamente.
Se a indústria do petróleo conseguisse o que deseja, abandonaríamos todos os esforços para reduzir emissões, com base na crença (altamente irrealista) de que simplesmente poderíamos remover a poluição do ar mais tarde.
Sinceramente, torço para que a RDC e a CDA se tornem soluções legítimas para a crise climática. Mas presumir que serão e, como resultado, abandonar outras estratégias, é o mesmo que acreditar em mágica.
Se a história nos ensina algo, é que o crescimento populacional sempre esteve associado a mais destruição, mesmo com o desenvolvimento de tecnologias avançadas.
Um recente artigo do “The Wall Street Journal” chamou a “obsessão pelas mudanças climáticas” de um “transtorno mental”. Esta é apenas uma parte de uma agressiva campanha de gaslighting – um termo que vem sendo muito usado, mas que se aplica perfeitamente nesse contexto.
Por motivos desde econômicos até emocionais, medos legítimos são reinterpretados não apenas como infundados, mas também delirantes, e até mesmo como um sinal de loucura. Antes fosse verdade. A realidade é que o pensamento catastrófico é totalmente justificado neste caso, já que os efeitos das mudanças climáticas – não apenas os previstos, mas aqueles que já estamos testemunhando – são devastadores.
Quando os otimistas climáticos afirmam que todo esse alarde é irresponsável, eles têm alguma razão: se ficarmos paralisados pelo medo e não acreditarmos que soluções melhores sejam possíveis, acabaremos sucumbindo ao desespero em vez de agir.
Cada indivíduo pode agir de uma forma própria, dependendo de seus interesses e habilidades – seja organizando um protesto, exigindo uma opção vegana na cantina da escola, fazendo doações para uma instituição ambiental ou concorrendo a um cargo público. O importante é manter pelo menos um pouco de esperança e fazer algo.
Como Michael E. Mann, professor e diretor do Centro de Ciência, Sustentabilidade e Mídia da Universidade da Pensilvânia, tuitou recentemente: “a preocupação e a ansiedade frequentemente nos motivam. O desespero e o desânimo, não.”
Estes sentimentos nos fazem pensar que não há motivos para ter esperança, e isso não é verdadeiro nem útil. Uma discussão sóbria e honesta sobre o clima deve despertar preocupação e ansiedade. Não o suficiente para nos paralisar, mas o suficiente para nos motivar a tomar medidas dramáticas e sem precedentes.