Startup francesa cria filtro biológico capaz de “despoluir” ambientes internos
Empresa usa engenharia genética para modificar bactérias e plantas, tornando-as capazes de eliminar poluentes do ar

Não é todo dia que a genética microbiana vira tema de conversa em uma festa badalada em Los Angeles. Mas lá estava Patrick Torbey, o único cientista no meio de um bar de vinhos repleto de plantas, explicando seu projeto para um grupo de influenciadores enquanto eles degustavam aperitivos artesanais com queijo brie derretido.
Torbey estava ali para apresentar o primeiro produto da Neoplants, startup francesa que fundou há seis anos com Lionel Mora, ex-gerente de marketing do Google.
Batizado de Power Drops, o lançamento promete atuar como um filtro de ar biológico – o que despertou o interesse dos influenciadores da área de bem-estar.
Mas, para os mais entusiastas da ciência, trata-se de uma inovação biotecnológica: bactérias do solo geneticamente modificadas que trabalham em conjunto com plantas para absorver e metabolizar substâncias tóxicas presentes no ar.
“Criamos um purificador de ar natural. Ao adicionar essas bactérias ao solo, conseguimos aumentar em cerca de 30 vezes a capacidade das plantas de filtrar poluentes do ambiente”, explica Torbey.
Os chamados compostos orgânicos voláteis (COVs) entram pelas minúsculas aberturas das folhas das plantas e saem pelas raízes. Quando as Power Drops são misturadas à água e aplicadas no vaso, as bactérias aderem às raízes e se alimentam desses poluentes, transformando-os em nutrientes para a planta. O resultado é uma redução de 30% das toxinas do ar em um espaço de até 15 metros quadrados.
“Essa tecnologia pode ser uma solução para um problema persistente: os COVs liberados por incêndios, que se acumulam em tecidos e móveis e continuam sendo reemitidos ao longo do tempo”, destaca Torbey. “Estamos usando a própria natureza como alternativa sustentável para esse desafio.”

Segundo a Organização Mundial da Saúde, a poluição do ar em ambientes internos é responsável por três milhões de mortes por ano e pode afetar a concentração, a produtividade e agravar problemas respiratórios como a asma.
Torbey recomenda o uso das plantas tratadas especialmente em quartos, como complemento aos purificadores de ar tradicionais, que bloqueiam partículas maiores, mas não capturam moléculas minúsculas como os COVs. “O processo pode ser mais lento, mas é muito mais sustentável, já que não consome energia elétrica”, ressalta.
GENÉTICA COMO FERRAMENTA
O desenvolvimento dessa tecnologia não foi simples. No início, a equipe tentou modificar diretamente as plantas para aumentar sua capacidade de absorver COVs, mas o processo se mostrou demorado e complexo. A solução foi focar nas bactérias, que podem ser modificadas e testadas rapidamente – além de passarem mais facilmente pelas regulamentações dos órgãos oficiais de controle.
A Neoplants criou duas cepas de bactérias capazes de metabolizar formaldeído, benzeno, tolueno e xileno, transformando esses poluentes em açúcares, aminoácidos e lipídios.
Para torná-las ainda mais eficientes, os cientistas usaram um processo chamado evolução direcionada, expondo as bactérias a ambientes cada vez mais tóxicos até que elas desenvolvessem versões super-resistentes.

“É como um treinamento intensivo para bactérias”, brinca Torbey. Ele credita a rapidez do processo à experiência de Lionel Mora no Google. “Queríamos trazer a velocidade do software para a biotecnologia.”
Cada frasco de Power Drops contém 10 bilhões de bactérias desidratadas, que são ativadas ao serem misturadas à água. A aplicação deve ser feita uma vez por mês e funciona melhor em plantas de folhas largas cultivadas no solo – o produto não é compatível com suculentas, plantas hidropônicas ou solos arenosos.
Embora não sejam indicadas para hortaliças comestíveis, as bactérias são inofensivas para humanos e animais de estimação. Além de melhorarem a qualidade do solo, a equipe acredita que, no futuro, elas também poderão impulsionar o crescimento das plantas.
NEOPLANTS: DO SOLO PARA O ESPAÇO
Enquanto aprimorava a pesquisa com bactérias, a startup seguiu trabalhando em outra frente: modificar geneticamente plantas para que elas próprias metabolizem COVs sem depender de microrganismos. O método consiste em identificar os genes responsáveis por essa função nas bactérias e inseri-los diretamente no DNA das plantas.
Agora que a tecnologia está pronta, a Neoplants aguarda aprovação do Departamento de Agricultura dos EUA – um processo que, até o momento, não sofreu com o impacto das recentes demissões no governo federal.
“Queríamos trazer a velocidade do software para a biotecnologia.”
Para evitar tarifas de importação, a empresa manterá sua área de pesquisa e desenvolvimento em Paris, mas vai fabricar os produtos nos Estados Unidos.
No futuro, Torbey espera que as descobertas da Neoplants sejam aplicadas para resolver desafios ambientais ainda maiores, tanto na Terra quanto em futuras colônias espaciais.
Um dos principais objetivos é desenvolver plantas que consigam absorver nitrogênio diretamente do ar, reduzindo a necessidade de fertilizantes nitrogenados. Esses fertilizantes são uma das principais fontes de óxido nitroso, um dos gases de efeito estufa mais potentes.