Por que o retorno ao escritório na Amazon é uma tremenda falta de imaginação
A política de retorno ao trabalho presencial da Amazon, que exige jornada de cinco dias por semana no escritório, é um grande erro
O recente anúncio de “retorno ao escritório” (RTO, na siga em inglês) da Amazon, exigindo que os funcionários trabalhem no escritório da empresa em jornada de cinco dias semanais, reflete um movimento preocupante entre executivos. Eles estão tentandor voltar no tempo e resgatar práticas antigas de gestão para tentar estimular o engajamento da força de trabalho.
Ajudei a coordenar equipes de funcionários de algumas das empresas mais influentes do mundo, incluindo Accenture, Apple e Deloitte. Acredito piamente que essas tentativas de forçar as pessoas a retornar a modalidades de trabalho ultrapassadas estão fadadas ao fracasso.
Eis o porquê:
AFASTA TALENTOS
Forçar a volta ao escritório não vai resolver o problema da debandada de talentos. Essa política não é apenas uma solução desastrada e mal pensada, ela revela uma falha de gestão mais grave.
A diretoria da Amazon, assim como a de diversas outras empresas, está se apegando a formas antigas de pensar, em vez de avançar em direção às necessidades da força de trabalho atual e ao potencial das novas modalidades de trabalho.
Os efeitos colaterais de exigências como essa, especialmente para as mulheres, já estão ficando claros. Uma pesquisa da Upwork revelou que, entre os executivos em nível de diretoria que impuseram políticas de retorno ao presencial, 63% notaram um movimento desproporcional de demissão das mulheres e 57% afirmaram que essa perda prejudicou a produtividade.
PREJUDICA A PRODUTIVIDADE
A Amazon, como muitas das empresas que estão exigindo o retorno ao trabalho presencial, parece estar presa a uma mentalidade pré-pandemia, quando a produtividade era medida pela presença física. No entanto, a pandemia nos ensinou que a produtividade não está vinculada a um local específico, e sim à forma como o trabalho é organizado e coordenado.
a decisão reflete uma dificuldade de imaginar novas formas de gestão em um mundo que passou por mudanças profundas.
A flexibilidade deixou de ser um benefício e passou a ser uma necessidade. De acordo com um estudo da McKinsey, 87% dos norte-americanos querem trabalhar em um ambiente flexível. Os mais jovens, especialmente os da geração Z, estão repensando o trabalho por completo, optando por carreiras que ofereçam autonomia e flexibilidade.
As empresas que ignoram essas tendências correm o risco de perder seus funcionários mais qualificados em um mercado de trabalho competitivo e, com isso, perder também as inovações trazidas pelas gerações mais novas.
O QUE OS GESTORES PODEM FAZER
Combater a falta de interesse dos funcionários e a queda de produtividade demanda mudanças de gestão. Não basta impor exigências, é preciso criar ambientes que atendam às necessidades das pessoas que compõem a força de trabalho. Aí sim os gestores poderão esperar, com razão, uma maior produção e melhores resultados nos negócios.
Veja de que formas os gestores podem reconfigurar suas abordagens:
- Desenvolver maturidade emocional: os gestores de hoje devem construir relações de confiança, cultivar relacionamentos interpessoais e criar um ambiente em que haja segurança psicológica. Para isso, é preciso ter maturidade para deixar de lado interesses pessoais, demonstrar curiosidade e se comunicar com as pessoas de forma transparente e empática.
- Priorizar as relações, não o controle: em vez de apostar na microgerência, os gestores devem criar espaços de colaborações verdadeiras e relações significativas. Para conquistar a confiança dos funcionários é preciso, antes de tudo, depositar confiança neles.
- Repensar a estrutura de trabalho: evitar reuniões desnecessárias e dar prioridade a trabalhos de maior impacto. Permitir que os funcionários tenham tempo para refletir e para trabalhar de forma criativa, e que tenham flexibilidade para administrar seus compromissos pessoais.
- Comandar com determinação e flexibilidade: as pessoas procuram trabalhos que estejam alinhados com seus objetivos, suas habilidades, seus valores e suas necessidades. O gestor deve contribuir para o bem-estar dos funcionários, oferecendo a flexibilidade necessária para que eles integrem trabalho e vida pessoal.
De acordo com a Gallup, as organizações que oferecem flexibilidade veem uma redução de até 59% na rotatividade e uma diminuição de 41% nas faltas ou afastamentos – dados que a diretoria da Amazon deveria considerar. Essas empresas sabem que a base do sucesso é a confiança, não a imposição de políticas ultrapassadas.
O QUE SE CONCLUI
No fundo, o anúncio de retorno ao trabalho presencial da Amazon envolve um problema de gestão. Acredito que a decisão da empresa reflete uma dificuldade de imaginar novas formas de gestão em um mundo que passou por mudanças profundas. O lugar onde o trabalho é feito importa menos do que a maneira como ele é feito.
O futuro do trabalho já chegou; agora precisamos nos concentrar em maneiras de aprimorar o fluxo de trabalho. Para facilitar esse processo, os gestores devem priorizar as relações humanas, o bem-estar e o engajamento, enquanto pensam em novas formas de colaboração e interação entre as equipes.
Combater a falta de interesse dos funcionários e a queda de produtividade demanda mudanças de gestão.
Reuniões intermináveis, prazos curtos e a exigência de que o funcionário esteja sempre “à disposição” são insustentáveis e contraproducentes.
A lição que se tira daqui é simples: imposições rígidas de retorno ao presencial não resolverão os problemas de desempenho ou de falta de motivação dos funcionários. É preciso que os gestores abram mão de soluções ineficazes e lidem com os desafios reais que estão afetando o interesse dos funcionários.
Os empregados não estão reivindicando menos trabalho ou padrões mais baixos. O que eles querem é um trabalho que propicie o bem-estar, permita a flexibilidade e onde haja confiança de que eles cumprirão suas tarefas.